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Se o(s) autor(es) da enormidade que é o modelo de ADD, mais os respectivos remendos simplex, fossem avaliados pelo trabalho que desenvolveram, não me resta a menor dúvida que além de um despedimento sumário com justa causa ainda deviam ser obrigados a repor todas as remunerações recebidas enquanto produziram este(s) aborto(s) legislativo(s).
A insistência na auto-fixação de objectivos individuais por parte dos professores avaliados, é um dos aspectos mais ridículos de todo o processo desenhado por umas mentes não brilhantes (eventualmente obnubiladas por substâncias pouco recomendáveis).
Já noutra entrada classifiquei como ridícula a ideia de os professores preencheram uma ficha com OI’s, porque os textos que aí serão registados serão necessariamente ridículos.
Perdoar-me-ão os leitores habituais, mas para poder demonstrar o ridículo a que se submeterão os colaboradores na farsa terei que me alongar um pouco neste post. Vejamos então de que falo, quando acuso de ridícula a ideia de preencher uma ficha de OI’s com frases ridículas e que apenas servem para fingir que se coopera com o poder:
- O DR 1-A/2009, no art. 3º n.º 2 determina que a intervenção dos coordenadores avaliadores está limitada ao pedido expresso do avaliado, e apenas se este quiser ter aulas assistidas;
- No art. 5º n.º 2 determina que a proposta dos OI’s seja exclusivamente entregue ao órgão de gestão, eliminando do processo os restantes avaliadores;
- No art. 8º n.º 2 esclarece que quando o avaliado não requeira a observação de aulas «a classificação final da sua avaliação corresponde apenas à classificação obtida na ficha de avaliação preenchida pela direcção executiva, expressa nos termos do n.º 2 do artigo 21.º do DR 2/2008»;
- Quando se cruza a ficha de avaliação a preencher pelo órgão executivo com a ficha de OI’s que terá que ser preenchida para dar cumprimento ao n.º 1 do art. 5º do DR 1-A/2009, sabendo que a definição dos OI’s vai ser feita a cinco meses do final do 2º ano do ciclo avaliativo (Jan-Fev/2009) e o PCE terá que preencher a ficha de avaliação reportando-se a um período de dois anos (Set/2007 a Jul/2009), a dimensão do ridículo começa a concretizar-se.
Mas vejamos, ponto por ponto, o que poderá aparecer na tal fichinha ridícula, com textos ridículos, a que pomposamente se quer chamar “Objectivos Individuais”:
“Apoio à aprendizagem dos alunos”
- Tenho visto de tudo. Desde pessoas que dizem «Pretendo apoiar todos os meus alunos, incluindo os que têm maiores dificuldades de aprendizagem», até outros que preferem um enunciado do tipo «Vou colaborar com o conselho de turma para promover as aprendizagens dos meus alunos, procurando obter maior sucesso».
- Em primeiro lugar, qualquer destes enunciados é absolutamente redundante e decorre do simples facto de se ser professor e aceitar um horário lectivo em que nos são atribuídas turmas com alunos que estão na escola para aprender. Não dar apoio às aprendizagens ou não colaborar com o conselho de turma seria não cumprir um dever funcional.
- Mas acontece que este item irá ser avaliado pelo PCE, que deverá pontuá-lo aferindo o “grau de cumprimento do serviço distribuído” e o respectivo “empenhamento”.
- Daqui decorre que a fixação do OI deve referir-se também ao “empenhamento” com que o professor se propõe apoiar os seus alunos e colaborar com o respectivo CT.
- Depois, como é natural, considerando que o PCE não é um ser omnipresente nem omnipotente, a atribuição de uma notação ao grau de empenhamento do professor terá que ser feita por uma de duas maneiras: i) a olhómetro, que como se sabe é um método muito eficaz e sobretudo muito justo de avaliar os desempenhos; ii) confiando no relato do próprio avaliado ou de terceiro(s) incerto(s), através do relatório de auto-avaliação que está previsto na legislação (embora não seja vinculativo), ou através de relatório(s) desse(s) terceiro(s) incerto(s), o que não está regulamentado.
“Participação nas estruturas de orientação educativa”
- Relativamente a este item tenho constatado a repetição de um OI que por vezes é enunciado no item anterior «Vou colaborar com o conselho de turma para promover as aprendizagens dos meus alunos, procurando obter maior sucesso».
- Não valerá a pena repetir o argumento de que esse é um dever funcional e que o seu incumprimento deveria ser punido, pelo que não me parece que possa ser enunciado como objectivo. Mas aqui também se deverá colocar a questão do grau de empenhamento, uma vez que o PCE deverá aferir em que medida o avaliado foi empenhado na sua participação nas estruturas.
- Como é natural, o processo de registo e preenchimento da ficha de avaliação por parte do PCE obedecerá aos mesmos princípios: i) olhómetro; ii) fé nos relatórios que ler.
“Participação e dinamização de actividades”
- Como é evidente este é um objectivo que não pode ser enunciado no final do período de avaliação. É que não basta enunciar o desejo de dinamizar ou participar em projectos e/ou actividades da escola, porque é necessário que os mesmos sejam aceites e aprovados pelos órgãos de gestão pedagógica e executiva.
- É por isso que dizer coisas como «Pretendo participar em cinco (seis, sete, n, actividades do PAA/PCT)» além de ridículo é completamente absurdo, sobretudo quando o projecto educativo e o plano anual já estão aprovados há muito.
- Claro que mais uma vez o método para avaliação do empenhamento na participação será um dos dois já anteriormente descritos para os outros itens, embora neste caso também seja relevante a quantidade de eventos em que o avaliado participa, seja como organizador/dinamizador, seja como colaborador ou assistente.
“Relação com a comunidade”
- No caso deste item, não estando clarificado o conceito de comunidade, o campo de intervenção pode ser alargado até ao infinito: desde um âmbito mais restrito, ao nível das relações no interior dos CT’s e respectivos alunos e pais, até à comunidade educativa em sentido mais amplo e que pode abranger o conjunto de escolas do agrupamento, mais as populações dos bairros e freguesias em que as escolas estão inseridas, ou até mesmo as relações com o município e as forças vivas do concelho, haverá objectivos para todos os gostos.
- O problema estará uma vez mais no grau de objectividade com que funcionará o olhómetro presidencial/reitoral, ou a fiabilidade dos relatos que chegam ao PCE/Director.
“Formação Contínua”
- Este é um objectivo necessária e obrigatoriamente enunciado no pretérito, uma vez que não é possível que alguém se proponha fazer formação para a qual não esteja previamente inscrito(a).
- A este facto acresce que o art. 6º do DR 1-A/2009 determina que «Para efeitos do disposto no presente decreto regulamentar e independentemente do ano em que tenham sido realizadas, são contabilizadas todas as acções de formação contínua acreditadas, desde que não tenham sido tomadas em consideração em anteriores avaliações.» Isto significa que em muitos casos o único enunciado possível seja: «Pretendo que me contabilizem os créditos das acções de formação que frequentei nos anos … conforme consta do meu processo individual»
Ora se isto é um Objectivo Individual, vou ali e já venho…
ramiro marques said:
Excelente post!
afribeiro said:
Na minha opinião, tudo o que se passou nestes 4 anos, é uma vergonha!
Transformaram as escolas em mercearias. As vendas ao público vão sendo feitas mas, tudo o que está em armazém vai ficar estragado e sem possibilidade de aproveitamento.
Foram 4 anos de tarefas erradas, não serviram para nada….. no que diz respeito a uma melhor educação. Serviram foi para o governo diminuir o nº de funcionários públicos à custa dos professores assim como a diminuição das despesas com a educação. Tudo o resto é pura propaganda. “Eles” tinham uma estratégia e pouco mais, tinha que ser tudo ao molho e de enxurrada para nos conseguirem apanhar desprevenidos enquanto descredibilizaram os sindicatos e viravam a opinião pública contra nós.
A divisão da carreira e a alteração da idade para a aposentação foi o que lhes interessava fazer, tudo o resto é acessório e, por isso, eles vão deixando cair bocado a bocado.
Tens razão em tornar visível o quanto pode ser ridículo o preenchimento destes OI, é tudo um faz de conta imenso com consequências gravíssimas entre profissionais. Todo o ambiente de trabalho é alterado. as relações deixarão de ser de cooperação e passarão a ser de desconfiança constante. O “certo” estará sempre do lado do que tiver algum poder e nunca do lado da justiça, da inovação e do empenho desinteressado.
A partir de agora, todo aquele se entregue muito a fazer qualquer coisa será olhado sempre de lado, será sempre mal avaliado pelos outros que não acreditarão na sua “ingénua” vontade.
O tempo que temos perdido com tudo isto, era melhor empregue em descobrir soluções para todos os problemas que a escola actual tem e que não passam por estas pantominices governamentais.
Paulo G. Trilho Prudêncio said:
Isso Francisco. Abraço.
maria said:
Brilhante, F.Santos!
Isto é tudo uma palhaçada monumental e o pior é que há quem pretenda entregar essa coisa e não perceba o ridículo.
Maria Lisboa said:
Sobre a avaliação daquela gente, gostava de ver esta cena: http://professorsemquadro.blogspot.com/2008/11/imagine-sr-ministra-imagine.html
A minha opinião (e disse-o ao meu “chefe”, que nem contestou) desde o 1º momento é a de que os OI são da inteira competência do PCE. Nada, nos objectivos individuais, remete para as funções de avaliação do coordenador/avaliador. São todos definidos em função dos itens da ficha de avaliação do PCE Sendo assim, não é lógico que se negoceie algo em que não se tem intervenção
O problema, Francisco, é que esta história do “apoio à aprendizagem dos alunos”, não tem só a ver com os tempos atribuídos para apoios. Tem a ver com a detecção de problemas e a disponibilidade do professor, para fora dos seus tempos lectivos, dar umas “explicaçõezinhas” para pôr os seus alunos “em dia”. (pelo menos ouvi a srª ME referir-se a isto, algures, num dia de despacho, num qualquer OCS.
Quanto aos instrumentos de medida, acho que podíamos formar uma sociedade e começar a produzir “disponibilómetros”, cumprimentómetros, interventómetros, participómetros e empenhómetros.
Para o empenhómetro já existe aqui, uma boa sugestão:
Para além de facilitarmos a vida a todos (até podíamos vender para outros avaliadores que não professores) e ainda fazíamos fortuna!. Todos acham que a nossa avaliação é uma maravilha. Como devem estar roídinhos de inveja por não terem uma assim, com estes medidores, podíamos generalizar o modelo a todas as empresas e funções públicas e todos ficavam contentes. 😉
Paula Silva said:
Muito atenta a análise. Concordo que tudo isto é absurdo, por isso me manifestei e fiz duas greves. E na minha escola tenho lutado como posso. Não vou pedir avaliação na componente científico-pedagógica e entrego os Objectivos Ind… bem, para não dar mais trabalho ao PCE… mas vamos entregar, no geral, um grande grupo de prof´s, Objectivos gerais e muito idênticos. Este ECD e Modelo de Avaliação é definitivamente um aborto….
Mas queria acrescentar que o Obj Ind no que respeita ao Apoio e Aprendizagem dos Alunos, este item colide com a acvaliação da componente lectiva, claramente. Ora se eu não pedi avaliação na componente científico-pedagógica, porque hei-de de forma redundante propor-me a fazer o que faço há mais de 19 anos??? que é ensinar e ajudar os alunos a ultrapassar dificuldades.. pois não é esta a nossa missão?? Está a por-se em causa que algum professor não o faça?
Por mim entregávamos todos os mesmos objectivos, vagos, gerais e humildes… assim superamo-nos e mostramos as fragilidades absurdas deste modelo de avaliação.
A luta ainda não acabou. Ninguém me reconheceu os Bons que tive no antigo modelo de Avaliação, porquê??? Ninguém reconhece que par além de uma licenciatura de 4 anos fiz dois anos de Ramo de Formação Educacional, que não é equivalente, nem a uma pós-graduação, nem a um mestrado… nem a nada!!! mas foram dois anos de muito trabalho académico, e sou só licenciada??? Há que mostrar os podres deste longo processo injusto de tratamento inadmissível de uma classe que devia ser bem mais dignificada. Qual é o recalcamento dos políticos??? Tiveram todos muito insucesso no Ensino Público??? Pois é, há que estudar… o processo ensino-aprendizagem é bilateral…
Bjs
saudações académicas
Ana, professora said:
Paula Silva:
1. Entregou OI e não há volta a dar nem argumentação que altere o facto;
2. entregar OI todos iguais APENAS facilita a vida ao PCE.
Logo, não só validou o sistema como tornou mais fácil a tarefa do seu PCE.
saudações amarelas
Foi para isto que fez as greves e as manifestaçãos?
Eu não. Os meus Objectivos Individuais ( com maiúscula) são ser tratada com Dignidade e Respeito mas admito que cada um terá os seus. Por isso NÃO ENTREGUEI os oi (com minúscula).
Elsa Covilhã said:
Ó Ana professora, emprestas-me as tuas palavras?
Quanta consciência, coerência e outas acabadas em _ência tais como leviandade.
Obrigada ao dono da casa pela exposição clara do ridículo.
Maria dos Ventos said:
Pois é. Se apontarmos os focos para o âmago das questões, ficará mais nítido o absurdo de tudo isto e só não verá quem mesmo não quiser. A reflexão é feita na base do “simplex”, mas, para mim, esta foi desde logo uma das questões que mais me incomodaram. Por este ridículo que se perspectivava no acto, mas antes de mais pelo princípio que se queria passar e em que assentava, ou seja, o da natureza “individual”. Como pode qualquer professor assumir objectivos individuais numa tarefa que se pode ser colectiva? Como pode conciliar-se a rectórica do trabalho cooperativo com esta atomização e responsabilização individual? É o “dividir para reinar”. É a lógica das “empresas do seu eu”. É o atrofiar da inteligência. É o roubar da alma.
Repito- esta é a questão vital que urge recusar, agora e sempre. Devemos ser unos e solidários. Na luta e no trabalho. Se não aceitamos a Escola como uma linha de produção, com autómatos desumanizados e a desumanizar.
Sabemos como tudo isto decorre dos “modelos” da “modernização administrativa”. Ouvimos como nos lembram que não somos “mais do que os outros funcionários públicos”. Logo à partida há que dizer que não somos mais, mas diferentes, e explicitar a natureza específica do nosso “mundo da educação”. Mas depois haverá também que combater a lógica da fatalidade – se para eles isto é absurdo, não há que estendê-lo, mas que aboli-lo! Há outras alternativas, mesmo que nos queiram fazer crer o contrário.
Maria dos Ventos said:
Correcção de dois erros:
…”numa tarefa que SÓ pode ser colectiva”
…RETÓRICA e não rectórica