Hoje é dia de S. Ranking. Para os defensores da livre escolha e do ensino privado é um dia particularmente feliz, porque, como titula o Público, As escolas públicas não resistiram a exames mais difíceis, tendo sido afastadas do “top 20”.
Curiosa e coincidentemente, passaram ontem 25 anos sobre a aprovação da LBSE que, dando cumprimento à Constituição da República, consagra a escola pública como um instrumento fundamental de coesão social e de defesa da equidade e igualdade de oportunidade entre os cidadãos.
Embora sem qualquer ligação com esta efeméride realizou-se, também ontem, no Instituto de Educação da Universidade de Lisboa, a Conferência Final do Projecto KNOWandPOL, durante a qual foram apresentadas as conclusões dos trabalhos de investigação levados a cabo pela equipa portuguesa que fez parte do consórcio.
Numa altura em que o retorno dos rankings acrescenta “validade” aos argumentos privatizadores de um “serviço público de educação”, tão de agrado das correntes neoliberais e tão acriticamente aceites por professores que “falam, falam, as não dizem nada e cada vez mais se assemelham aos jornalistas que temos”, recomendo vivamente a quem quiser saber um pouco mais sobre governança, governação pelos instrumentos de acção pública e/ou formas de regulação soft das políticas públicas, que consulte o muito material já disponível no sítio da Internet do projecto Know&Pol.
À laia de “aperitivo” deixo um breve trecho do capítulo introdutório de um dos livros que contém resultados da investigação produzida em Portugal, e que foi apresentado de uma forma extraordinária e brilhante pelo professor Licínio Lima.
Multiplicação das comparações, das boas práticas e dos saberes baseados na experiência
Ainda que a tendência geral seja a utilização crescente de todos os tipos de conhecimento no processo de decisão ou de regulação, há três que merecem um destaque especial: indicadores e comparações; “boas práticas”; saberes baseados na experiência.
Indicadores e comparações
A utilização de sistemas de indicadores não deixa de aumentar em todos os sectores da acção pública. Eles permitem comparar uma comunidade com o seu passado, com outras comunidades ou ainda com metas (“benchmarks”). Mais do que nunca, as comunidades comparam-se entre si ou são comparadas aos outros. O impacto desses indicadores está intimamente ligado à capacidade dos seus conceptores para convencer da sua fiabilidade e da sua pertinência. A construção de indicadores exige uma série de esforços e de procedimentos para suportar a sua “validade” e a sua “objectividade”, com o fim de aparecerem como não-ideológicos. Apesar de eles serem o resultado de processos sociais que envolvem conflitos, relações de força, disputas de interesse e compromissos. Embora sejam apresentados, muitas vezes, como resultantes do modelo de “políticas baseadas em evidências”, não podemos pensar que este conhecimento é feito, pela primeira vez, para servir os decisores, ou que apoiam directamente o processo político. Eles são também, ou principalmente, feitos para o público, concebidos para fornecer aos utentes, pacientes, clientes ou cidadãos instrumentos de conhecimento que colocam os seus representantes e as elites tradicionais sob uma certa forma de vigilância. Indicadores e comparações são mobilizados, principalmente, para pôr certos problemas na agenda política. Mas eles são insuficientes para travar o debate. Até porque, muitas vezes, um mesmo indicador pode ser utilizados para a defesa de posições opostas. (pp 20-21)
Barroso, J. e Afonso, N. (2011), Introdução in Políticas Educativas: Mobilização de conhecimento e modos de regulação, Barroso e Afonso (org.), Fundação Manuel Leão, V.N.Gaia