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… e por lá, ao contrário do que Nuno Crato decidiu ao pôr fim à Formação Cívica, o governo está preocupado com a “iliteracia cívica” dos estudantes
15 Domingo Jan 2012
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… e por lá, ao contrário do que Nuno Crato decidiu ao pôr fim à Formação Cívica, o governo está preocupado com a “iliteracia cívica” dos estudantes
06 Domingo Nov 2011
Posted cidadania, comunicação social
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Os tempos difíceis que vivemos não se esgotam nas dificuldades económicas e na crise financeira que atravessamos.
Podemos mesmo afirmar que, face aos mecanismos soft de controlo social que são utilizados pelas forças dominantes na sociedade, é a própria democracia que está em causa.
Sem que a esmagadora maioria da população se tenha dado conta, os novos modos de governança utilizados e impostos pelo capital e pelos seus administradores executivos – os partidos da indiferenciação central que abrange o arco da democracia cristã à social-democracia, seja mais alaranjada ou amarelada – traduziram-se numa reorganização dos poderes existentes na sociedade.
Quando recorrentemente ouvimos comentadores indignados e pesarosos pela inexistência de “estadistas como os que construíram a Europa”, devíamos estar atentos e ver as lágrimas de crocodilo que rolam ao sabor desse discurso.
Hoje muitos se queixam de que o poder político está subjugado ao poder económico, esquecendo ou omitindo dolosamente que o poder económico utiliza como instrumento dessa subjugação o poder mediático, de que se apoderou com a conivência dos tais “estadistas” de antanho.
No nosso país está ainda por fazer a história da privatização da comunicação social e das implicações que a liberalização das ondas hertezianas teve na apropriação dos meios de comunicação social pelos grandes grupos económicos nacionais e estrangeiros, bem como a história de como os governos apoiaram tablóides em dificuldade económica ao mesmo tempo que foram asfixiando grande parte da imprensa regional e local que se constituía como espaço de liberdade e reflexividade cidadã.
Sob a capa da objectividade e da informação especializada, temos vindo a assistir à imposição de um pensamento único, promotor da agenda neoliberal e profundamente antidemocrático, porque cerceador de vozes contraditórias. E sempre ao serviço da agenda económica imposta ao poder político.
Um excelente exemplo de como se processam estes mecanismos de imposição da agenda económica sobre a decisão política foi analisado numa tese de doutoramento e em diversos artigos publicados em revistas científicas, a propósito do papel do jornal Público e do seu ex-director José Manuel Fernandes na questão da publicação dos rankings escolares.
Tratando-se de uma análise e um discurso que ajuda a perceber, e pôr em causa, o cânone dominante e o poder mediático, ficou “convenientemente” remetido à circulação nos meios académicos. Talvez por isso o convite que deixei à(o)s jornalistas que “fazem” educação; e estiveram no dia 28 de outubro na Bucholz, para estarem presentes no IE a assistir ao seminário “Uma análise da reflexividade produzida pela imprensa escrita de referência a propósito dos rankings escolares” não tenha sido aceite.
Também por isso aqui fica um pequeno excerto de um artigo da professora Mª Benedita Portugal e Melo, que proporcionou a quem assistiu um excelente seminário.
Segundo Ramonet, os conflitos entre a imprensa e o poder adquiriram, actualmente, uma dimensão inédita não só porque o poder já não se identifica unicamente com o poder politico, devido a ascensão dos poderes económico e financeiro, como porque a comunicação social já não se encontra numa relação automática de dependência com o poder politico.
Como a própria hierarquia tradicional dos poderes foi alterada o primeiro poder é hoje claramente exercido pela economia, sendo o segundo (fortemente interligado com o primeiro) o poder mediático, constituindo este um instrumento de influência, de acção e de decisão tão forte que remeteu para o terceiro lugar o poder politico.
Nesta ordem de ideias, a informação veiculada pela comunicação social poderá ser encarada como uma «informação-mercadoria» que também serve os interesses dos grupos industriais e financeiros. As pressões exercidas pelos accionistas proprietários dos media sobre o conteúdo da informação e a forte concorrência mediática levarão os media a procurarem atingir, entre outros objectivos, a rentabilidade económica e o lucro.
Terá sido esta principal motivação que esteve subjacente à produção de notícias sobre a avaliação do sistema de ensino e sobre o ranking escolar?
A verdade é que através da construção destes temas e do seu «lançamento» para a «praça pública» foi possível obter bastante informação, que originou a construção de mais informação passível de ser publicada ao longo de bastantes meses. A luta pela obtenção de informação sobre os exames nacionais do 12º ano levada a cabo por este jornal pode, por isso, também ter estado relacionada com um principio economicista simples: informação origina mais informação que pode ser vendida.
De facto, as empresas de comunicação escrita são empresas económicas que tem de ser concorrenciais no mercado económico. Neste sentido, o campo jornalístico tem de oferecer produtos capazes de serem vendidos no mercado jornalístico. O produto posto à venda pelo Publico terá sido a própria «opinião pública» publicada que se foi formando e alimentando continuamente a propósito das questões educativas que o próprio jornal previamente determinou.
Mas, para além disso, os jornalistas do Público, como todos os outros, possuem determinadas posições ideológicas que consciente ou inconscientemente veiculam nas noticias que produzem. Na verdade, os jornalistas não formam um corpo homogéneo, encontrando-se divididos por pertenças de classe, clivagens ideológicas e posições distintas perante o próprio processo de produção noticioso. Assim, quer as opções editoriais tomadas pelos directores e subdirectores no que respeita as questões da avaliação do ensino e ao ranking escolar, quer a produção de opiniões que foram divulgadas a este respeito, revelam a orientação das suas concepções ideológicas. Em nome da defesa da modernização do sistema educativo português, estes actores sociais, na retórica argumentativa que produziram a propósito da necessidade de se proceder a avaliação dos estabelecimentos de ensino, revelaram um conjunto de crenças associadas à lógica da racionalidade económica, da optimização e promoção da eficácia características das actuais tendências neoliberais que assentam na ideologia do mercado.
Melo, M.B. (2005), Os circuitos da reflexividade mediatizada, in Análise Social vol. XI (176), 2005, 595-617
20 Quinta-feira Out 2011
Posted acção pública
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Nos últimos anos tem havido um intenso debate, promovido pelos que se reclamam de um pensamento mais à esquerda na sociedade portuguesa, que acusam o PCP de querer controlar os movimentos sociais, impedindo a espontaneidade característica de um individualismo exacerbado que campeia entre os auto-intitulados “independentes”.
O filósofo “socialista” Manuel Maria Carrilho, mais que insuspeito de “comunismo ortodoxo”, assina hoje no DN uma crónica em que enumera algumas das críticas feitas pelas correntes comunistas em relação aos novos movimentos sociais de indignados. Será que MMC se tornou um perigoso comunista ortodoxo? Terá ele assinado uma ficha de inscrição no PCP? Dúvidas que nos ficam após a leitura do seguinte:
24 Sábado Set 2011
Posted educação, escola pública, neo-conservadorismo, neo-liberalismo
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Manuel Jacinto Sarmento é Professor e director do Departamento de Ciências Sociais da Educação do Instituto de Educação da Universidade do Minho. É uma das vozes respeitadas em matéria de investigação e estudo sobre a escola pública, com obra publicada no país e no estrangeiro. Não tem, ao contrário de Nuno Crato, um acesso facilitado aos meios de comunicação de massas, como a televisão, sobretudo em horário nobre. O seu percurso também não inclui a preparação meticulosa para a ascensão a cargos governativos. Na verdade trata-se de um académico, e não de um político de plástico ansioso por uma carreira governamental ou na administração de empresas, sejam elas públicas, ou parcerias público-privadas.
O Le Monde Diplomatique, na sua versão portuguesa, acaba de publicar na edição de Setembro um artigo em que o professor Manuel Sarmento faz uma desmontagem do discurso cratês, traduzindo a respectiva ideologia e proposta política, ao mesmo tempo que nos dá as pistas para melhor entender a contradição entre o ideológo e o ministro. Sempre sem perder de vista a necessária resposta que a escola pública democrática e os seus defensores têm que encontrar para o ataque neoliberal a que continua sujeita, agora às mãos de Crato.
Uma ideologia educacional, por si só não faz uma política. O ideólogo Crato confrontar-se-á, amiúde, com a agenda conflituante do ministro Crato. Não é claro que a política educativa do XIX Governo Constitucional seja a governamentalização do cratês. Não porque as bases ideológicas do governo sejam distintas das do independente Nuno Crato. Pelo contrário, Crato é ministro por afinidade ideológica com as concepções neoliberais e neoconservadoras da aliança governamental. Mas porque uma ideologia corresponde a uma visão da realidade que não «encaixa» com a complexidade do real, quando se procura transformar em força de acção. Aliás, o tom mitigado da apresentação do programa de governo para a educação na Assembleia da República, não disfarçando propósitos, limita as ambições transformantes.
No quadro austeritativo da política actual, o mais certo é que Crato se preocupe sobretudo em garantir as alianças necessárias para construir um programa mínimo de acção: reforço das políticas de avaliação a todos os níveis, reestruturação curricular, destruição de recursos educacionais (nomeadamente com despedimento em massa de professores) e desmantelamento das políticas cujo sentido é o do combate às desigualdades escolares (Programa Novas Oportunidades; Territórios Educativos de Intervenção Prioritária; Programa e-escola; etc.); introdução progressiva de medidas de esvaziamento do papel do Estado na educação.
Um novo ciclo político desafia a escola pública. Mas, se o real se opõe à aplicação mecânica de ideologias simplificadoras, é importante que do mundo real das escolas públicas se exprima o desejo de que este novo ciclo seja revertido e que, no interior das contradições que gera, se exprima o sentido de uma outra política possível para a defesa da escola pública, enquanto espaço de afirmação de conhecimento, cultura, cidadania e igualdade. (Sarmento, M.J., O cratês em discurso directo: ideologia e proposta política, Le Monde Diplomatique, ed. portuguesa, Setembro 2011)
17 Domingo Jul 2011
Posted educação, equívocos, escola de elites, escola de massas
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No título deste post utilizo o termo facilitismo com a intenção de demonstrar que ele pode ser mais facilmente associado à solução mágica dos exames do que ao princípio republicano da escola para todos.
O termo facilitismo remete-nos para o acto de facilitar algo que por natureza é difícil e custoso, exigindo normalmente grande esforço para ser realizado.
No discurso “crático”, que se caracteriza por um forte apelo ao populismo e à demagogia, os exames surgem como uma espécie de garantia de que o ensino é rigoroso e o trabalho de aprendizagem que os alunos têm que fazer é exigente pois, caso contrário, os resultados serão negativos, os alunos chumbarão e os professores poderão ser responsabilizados pelo insucesso.
Este é um discurso populista e demagógico porque, ao fazer apelo ao senso comum e ao modelo em que se formaram e reproduziram as elites que hoje governam, opinam e ensinam, surge como música harmoniosa aos ouvidos do mainstream.
Este discurso surge normalmente associado a uma comparação distorcida entre realidades completamente opostas, como são as que enformam a ideia de uma escola destinada a seleccionar e garantir a reprodução das classes sociais dominantes, por oposição a um modelo de escola em que todas as crianças, jovens e adultos não escolarizados têm acesso ao conhecimento e à diversidade cultural.
Esperar que a escola torne iguais as condições de sucesso entre alunos provenientes de classes sociais diferentes, sem tornar iguais, ou pelo menos semelhantes, os direitos de acesso aos bens essenciais – alimentação, saúde, rendimento disponível, segurança social, etc. – é mais do que uma utopia, uma enorme barbaridade e mistificação da realidade.
Esperar que os exames sejam o instrumento dessa transformação social é uma aldrabice que se destina a justificar a perpetuação da função selectiva da escola, a menos que esse instrumento só se aplique depois de garantidas as condições de igualdade que não existem.
Chegados aqui podemos afirmar que o conceito de escola pública para todos é algo de muito exigente, não tanto para os professores que nela trabalham ou para os alunos que nela aprendem. Uma escola para todos é altamente exigente para a sociedade como um todo, em particular para os decisores políticos e para quem tem a incumbência de coordenar as políticas educativas.
A exigência e o rigor de que falo, fazendo um apelo a toda a sociedade, só podem obter resposta com um esforço colectivo para proporcionar a todos os cidadãos a satisfação das suas necessidades básicas, para que passe a haver disponibilidade para uma focagem nas necessidades de um grau superior (Maslow).
O recurso aos exames, sem que o caminho anterior esteja percorrido, é tudo menos justo e equitativo. Pior do que isso, pode ser extremamente prejudicial para a sociedade ao permitir que crianças e jovens sejam excluídos apenas porque os handicaps sociais de que são portadores os impedem de obter o mesmo sucesso escolar.
Não se pode esperar que um aluno filho de desempregados, sem acesso a bens culturais, sem acesso a um computador e à Internet sem ser na escola e em condições precárias, obtenha os mesmos resultados em exames do que o filho de pais da classe média/média alta, bem nutrido, com acesso a cuidados de saúde privada, Internet, 200 canais por cabo, férias no estrangeiro, visitas a museus, teatro e cinema e uma estante repleta de livros com clássicos portugueses e estrangeiros.
Recorrer aos exames para exigir trabalho, sem antes cuidar dessas desigualdades, isso sim é facilitismo porque facilita a tarefa dos governantes que têm a obrigação de olhar as políticas públicas de uma forma integrada e não exclusivamente sectorial.
Facilitismo é não cuidar da justiça social e da equidade. Facilitismo é recorrer a uma retórica populista e demagógica, em vez de meter mãos à obra e corrigir as desigualdades sociais que aprofundam a divisão entre os muito ricos e os que quase nada têm.
08 Sexta-feira Jul 2011
Posted cidadania, educação, escola pública
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Os resultados das eleições de 5 de Junho foram globalmente maus para as forças de esquerda, embora só por falta de lucidez se pudesse pensar que as coisas seriam diferentes.
Para os professores o panorama piorou porque o número de deputados que sempre se mantiveram firmes na defesa dos nossos problemas e anseios baixou de 31 para 24. Obviamente excluo deste número os deputados eleitos pelo PS, embora possa admitir que na actual legislatura venham a ter algum assomo de consciência e se recusem a desvirtuar completamente a Constituição da República, escancarando a porta legal para o assalto dos Chicago Boys portugueses ao que resta do nosso estado social.
Quem tenha olhado com atenção para a composição do actual governo, tendo conseguido ver para lá do efeito propagandístico da diminuição do número de ministros, ficou desde logo preocupado com a escolha dos ministros anunciados como independentes. Quais cavaleiros do apocalipse, os 4 independentes e as pastas que lhes foram atribuídas são a evidência, que nem seria necessário explicitar, de que estamos sob o ataque final dos discípulos de Milton Friedman. Pedro Passos Coelho (PPC) optou por colocar à frente dos ministérios chave para a execução desse plano quatro fervorosos adeptos dos princípios do deus-mercado. E essa escolha é clara quanto às intenções de promover a entrega ao capital dos sectores mais lucrativos da economia, como é o caso dos monopólios naturais da água e energia, estratégicos como a rede energética e as comunicações, ou os sectores sociais como a saúde e a educação.
Dias mais tarde o programa do governo limitou-se a colocar no papel essas intenções, deixando apenas camufladas e subentendidas as questões que neste momento possam parecer mais controversas ou gerar algum mal-estar social.
No que à educação diz respeito estamos perante uma situação difícil e complexa. Se Maria de Lurdes Rodrigues (MLR) foi um factor de unificação da esmagadora maioria da classe, incluindo até muitos professores que tradicionalmente se reviam nas posições do PS, já Nuno Crato (NC) será factor de divisão e separação de águas, conseguindo até recuperar parte substancial dos apoios que a sua antecessora teve no início do seu mandato, antes de ter passado à condição de descartável na comunicação social e má onda eleitoral para o PS.
O discurso anti-eduquês que nada significa, para lá de ser um excelente negócio e dar visibilidade a alguns dos seus praticantes como NC, Maria do Carmo Vieira (MCV) ou Guilherme Valente (GV), o apelo ao rigor e à autoridade ou o acenar com muitos exames são artifícios retóricos que soam bem aos ouvidos de muitos professores. Disso é sinal explícito o aplauso generalizado ao ministro, que é ampliado e difundido na comunicação social e nos blogues de professores.
De resto, na blogosfera docente apenas um factor diminui a intensidade do aplauso a NC e PPC: não terem ainda suspendido a ADD. Só isso divide os que em 5 de Junho escolheram votar à direita, levando a que os desiludidos pela não suspensão se reúnam em torno da bandeira Santana Castilho (SC), que se assume desde a primeira hora como o defensor total e definitivo dos professores defenestrados pelo incumprimento da palavra do 1º ministro.
Isto coloca-nos perante a situação extremamente difícil em que se continuará a fazer a resistência ao ataque neoliberal contra a escola pública, uma vez que continuaremos a assistir a um ataque aos direitos de todos os trabalhadores embrulhado num discurso de procura de consensos sociais, de rigor e exigência do mercado por oposição ao laxismo da esquerda estatista, e da inevitabilidade de obedecer aos ditames de quem nos tutela sob pena de acordarmos um dia sem salários.
Fica assim claro que isto só lá vai com muito trabalho e dedicação. Isto só lá vai se for possível explicar que o projecto de NC para a educação visa acelerar o processo de desmantelamento da escola pública, substituindo-a pelo conceito de serviço público de educação que poderá ser prestado por uma escola municipal ou uma escola privada, as quais deverão concorrer entre si para que se elimine a pior segundo uma lógica do darwinismo económico defensor da sobrevivência dos mais fortes e aptos num mercado concorrencial.
Por isso o que se adivinha relativamente ao modelo organizacional das escolas é o aprofundamento do modelo actual de gestão, com eventual profissionalização dos directores e progressiva diminuição da intervenção dos professores nos órgãos de decisão estratégica e operacional da escola. Do mesmo modo que o programa de verticalização das unidades de gestão replica o modelo dos grandes estabelecimentos privados, que vendem serviços educativos do pré-escolar ao 12º ano.
No que diz respeito à carreira docente é fundamental que os professores saibam que a sua simplificação, associada ao reforço do poder das direcções, significa que deixará de haver carreira e os professores passarão a progredir de acordo com o arbítrio dos órgãos de gestão da escola em que trabalham. Sem esquecer que tudo isto está intimamente ligado à facilitação do processo de contratação e despedimento, numa lógica eminentemente empresarial de eliminação dos trabalhadores incómodos e redução dos custos salariais, claramente beneficiada pela legislação laboral que facilita os despedimentos e prolonga a precariedade laboral.
Bem sabemos que este caminho foi aberto e trilhado pelo PS, numa altura em que muitos professores acreditavam que tínhamos um governo de esquerda. Espero que agora essa ilusão seja definitivamente afastada e não venhamos a ter entre muros demasiados colegas que acham que NC merece o benefício da dúvida, deixando para quando for tarde demais a resistência e a luta em defesa de uma escola pública, democrática e para todos.
Perante as dificuldades e o ataque que vamos sofrer é vital que os professores voltem a ter uma voz activa e reflexiva no interior das escolas. Podemos e devemos utilizar os novos meios de comunicação electrónica mas, por si só, isso não chega. É fundamental intensificar o contacto com outros colegas menos atentos promovendo a discussão franca e leal sobre a escola que queremos e a escola que nos está a ser imposta.
As aulas terminaram, os professores vão ter agora direito a um merecido descanso e é tempo de retemperar forças. Mas não é tempo de baixar a vigilância e ignorar o que o futuro nos reserva, porque o governo e o ME não vão de férias. Adivinham-se tempos ainda mais difíceis e um Setembro que pode vir a ser muito duro para um número significativo de colegas, em especial os contratados a quem não será renovado o vínculo. Mas também para muitos professores dos quadros que serão forçados a uma mobilidade mascarada, cumprindo partes do horário em diversas escolas do mesmo agrupamento. Ou então forçados a uma mobilidade efectiva devido aos horários zero.
Se temos que reconhecer que hoje a simpatia de NC e o estado de graça de PPC constituem um sério obstáculo à unidade dos professores na defesa dos seus direitos, convém não desesperar e aguardar que a verdade faça o mesmo percurso do azeite, aproximando-se da superfície, tornando visível o programa oculto do governo e permitindo o esbatimento das clivagens e preconceitos ideológicos que impedem muitos de ver o óbvio: entregar o ensino às leis do mercado será o passo decisivo para acabar com o ideal de uma escola humanista, inclusiva e formadora de cidadãos de pleno direito.
03 Domingo Jul 2011
Posted educação, escola de massas
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A chegada de Nuno Crato ao ministério da educação tem sido saudada por muitos professores com base na interpretação benigna, baseada numa espécie de wishfull thinking, que fazem do seu discuro: anti-eduquês, de reposição da autoridade e da generalização dos exames como garante da qualidade.
Quando, no recente debate do programa do governo, o ministro afirmou que «se não houver exigência nas escolas, serão os filhos dos mais ricos, que têm hipóteses alternativas, que acabam por progredir, em detrimento dos mais pobres», as bancadas do PSD e do CDS entraram em delírio e os seguidores de Nuno Crato que sonham com o “desmantelamento do poder da esquerda no ME” atingiram o êxtase .
É mesmo verdade. Há professores, e outros portugueses, que acreditam que é uma escola selectiva que garante o acesso de todos ao pleno usufruto do conhecimento libertador e promotor da igualdade entre os cidadãos.
A tirada de Nuno Crato, lida fora do contexto do seu discurso global sobre a escola e o ensino, é sem dúvida apelativa e merece o apoio de qualquer pessoa preocupada com o futuro dos portugueses e que tenha um mínimo de consciência social.
Só que isto é dito por uma pessoa que insiste na uniformização do controlo selectivo dos exames e sem explicar como se tratarão os casos de todos quantos não conseguirão ultrapassar o limiar da excelência preconizada. Será através da repetição sistemática dos programas em que falharam, num ciclo mais ou menos prolongado de chumbos e reforço do fracasso? Ou será desconstruindo o paradigma da escola napoleónica e aos quadradinhos, para a qual nos remete o discurso de Crato sobre o liceu dos seus tempos de estudante? Tanto uma solução como outra têm, nos tempos actuais, um problema de monta: aumentam substancialmente os custos com o sistema. A menos que se espere que a repetição do fracasso afaste muitos da frequência escolar, como nos tempos em que os pais tiravam os filhos da escola porque «o meu rapaz não tem cabeça pr’ós estudos». O que, por sua vez, contraria a intenção de combate ao abandono escolar.
Curiosamente, esta ideia do exame controlador das aprendizagens, e mecanismo de punição dos relapsos que não estudam, casa muito bem com uma ideia de reforço da autoridade do professor. É certo que se trata de um entendimento de autoridade baseado num modelo hierárquico e burocrático da escola, em que a autoridade reflecte um poder que advém da posição que professor e aluno ocupam na escala social. Evidentemente que esta concepção de escola, reprodutora de um modelo social classista, assenta que nem uma luva a quem acha que uma sociedade pacífica e pacificada é uma sociedade em que não se deve questionar a autoridade divina ou hierárquica, sob pena de se cair no caos e na desordem.
No entanto este é um modelo que, a menos que seja imposto pela força, já não é aplicável na sociedade do séc. XXI. Uma escola com professores cuja autoridade seja imposta por um poder hierárquico, outorgado por um sistema centralizado (que tanto se diz querer combater), não tem futuro como escola para todos. É que quando os alunos não reconhecem a autoridade do professor bem pode este estar investido de imenso poder pelo director, pelos secretários de estado, pelo ministro, ou até pelo presidente da república. Nada disso interessará para que o aluno aprenda o que o professor pretenda ensinar-lhe. E o insucesso e o absentismo continuarão a fazer o seu caminho, vindo a desaguar muitas vezes na marginalidade e na prisão.
Uma escola que não tenha o suporte das outras instituições, e que pretenda sozinha educar e instruir, pode até produzir autómatos; nunca formará cidadãos.
02 Sábado Jul 2011
Posted educação
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No blogue do Miguel Pinto encontrei um post reproduzindo um texto de Licínio Lima. Confesso que gostaria de ter tido competência suficiente para o ter escrito. Assim, limito-me a aconselhar a sua leitura:
Nota: em comentário o Miguel deixou-me o link directo para a Página da Educação, onde o texto foi publicado originalmente
26 Domingo Jun 2011
A palavra eduquês não foi cunhada por Nuno Crato, como muita gente pensa, mas pelo ministro da Educação Marçal Grilo, do governo socialista de António Guterres. O termo de Grilo referia-se criticamente ao jargão pomposo, mas vazio e incompreensível, com que certos pedagogos do dito ministério redigiam os seus relatórios. Uma “linguagem retorcida, falsamente académica e obtusa”, escreveu em 2007 sobre o eduquês o filósofo Desidério Murcho, que observava também isto: “Regra geral, quanto mais obscuro é um texto, mais o autor tem incompetências a esconder.” Até aqui, tudo bem.
Eis senão quando o genial Nuno Crato se apropria do termo de Marçal Grilo, fazendo dele título do livro “Eduquês” em Discurso Directo (Gradiva, 2006), mas conotando-o arbitrariamente com as doutrinas pedagógicas do chamado “facilitismo”. Quando hoje se fala em eduquês, evoca-se a messiânica figura de Nuno Crato, o mais recente salvador da educação em Portugal. Crato sabia muito bem que todo o português medianamente sensato é alérgico ao facilitismo, mas sabia melhor ainda que ao abordar o assunto estava a acariciar uma zona erógena do público conservador, esse mesmo que coloca os filhinhos em escolas privadas, mas está sempre a dizer mal do ensino público, porque alegadamente lhe vai ao bolso. A jogada publicitária de Crato rendeu bem, como a sua carreira posterior exemplifica.
A crítica do facilitismo é pau para toda a obra, usado alternadamente, e até simultaneamente, com a crítica do insucesso escolar. Se há muitos chumbos, é a falência do sistema de ensino, se há poucos, é o cancro do facilitismo. Entre a falência e o cancro, o Ministério da Educação tem ainda cento e tal mil professores à perna, que não querem ser avaliados. Não os avaliar é irresponsabilidade (e facilitismo), avaliá-los é prepotência. Estás feito ao bife, Ministério.
Pelos sentimentos catastrofistas e irracionais que frequentemente desperta, a crítica do facilitismo é um argumento de eleição (e de eleições) contra a democratização do ensino, que é assim responsabilizada pela falta de educação que os pimpolhos levam de casa para a escola. A crítica do facilitismo do sistema iliba de responsabilidades o facilitismo das famílias e reconforta os contribuintes que fogem ao fisco.
A partir do livro do Crato foi a desbunda total, cada qual puxando a semântica para a sua brasa. O matemático Jorge Buescu, por exemplo, identificou no “eduquês” uma doutrina global, já não só portuguesa, mas mundial, abrangendo países da primeira linha, como a Grã-Bretanha. Essa doutrina global preconizaria, idiotamente, o “desaparecimento dos conteúdos” no ensino, o “esvaziamento do currículo”, em nome duma estúpida luta contra o “formalismo” do ensino. Segundo os depravados propagandistas do “eduquês” (explica Murcho), o formalismo consistiria, em “repetir sem compreender palavreados, fórmulas, factos, datas.” Ora a crítica do formalismo teria levado (segundo Murcho) os pedagogos do “eduquês” a preferirem os debates, as “exposições da treta” e os “teatrinhos de trazer por casa” à realização de testes e exames. O Murcho jura que sim.
Inevitavelmente, veio depois um pateta qualquer e disse que o eduquês se resumia afinal em decorar ideias “politicamente correctas”, parvoíces vagas e sem substância, como a ecologia e o anti-racismo. Veio outro imbecil e proclamou, convictamente, que o eduquês era “a política de educação da esquerda.” Não sei se já alguém descobriu que o inventor do eduquês foi José Sócrates ou o falecido Bin Laden. Aguardo desenvolvimentos.
Zé Barreto, 26 de junho de 2011
26 Domingo Jun 2011
Posted acção pública, democracia sob tutela
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Numa altura em que cada vez mais vozes falam de um possível fim do euro e de uma eventual implosão da união europeia, seja com receio que isso aconteça, seja por que acham ser a melhor solução, o que sobressai é a falta de democracia, no sentido em que os povos não são chamados a debater essas opções de uma forma clara e inequívoca.
Tal como aconteceu quando se deu a adesão à então comunidade económica europeia, e mais tarde a adesão à zona euro ou quando da assinatura dos vários tratados que vêm alterando as formas de governo dos povos europeus, também a solução por um ou outro caminho – aprofundamento federalista da união ou exclusão dos países periféricos – será tomada à margem da opinião dos respectivos povos.
Nada que Saramago não tivesse analisado e não tivesse chamado a atenção para a necessidade de debater profundamente – o que é hoje a DEMOCRACIA