O que aconteceu na África do Sul, com um pelotão de fuzilamento polícia de choque a despejar os carregadores das suas armas sobre trabalhadores em greve, é apenas mais um episódio ilustrativo da forma como o direito à propriedade privada se sobrepõe ao direito à vida na perspetiva do capitalismo global:
Nas imagens difundidas pela televisão vê-se um pequeno grupo de grevistas a correr em direção do pelotão de fuzilamento polícia, mas não são visíveis disparos dos grevistas nem é possível afirmar que estes estivessem armados. No entanto, lá como cá, o ministro da polícia argumenta que os oficiais estavam debaixo de fogo.
Induzindo nos leitores a aceitação da narrativa da auto-defesa policial, o artigo do Público mostra em destaque a fotografia de um homem armado com uma lança, em postura ameaçadora, e um grupo de grevistas em que se vêem alguns paus e catanas. Mas na mesma sequência de fotos, a que mostra os mineiros mortos não mostra nenhuma arma nas suas mãos.
A forma expedita como um político carreirista consegue obter os graus académicos, com que acha que precisa de se apresentar aos seus pares, apenas revela o caráter desse tipo de personagem que medra entre as juventudes partidárias do “arco do poder”, e que explica porque é que o “videirismo” tem precedência sobre a honestidade, neste país em que basta ter um olho para ser rei entre cegos.
O que me incomoda no caso de Relvas, tal como me incomodava no caso de Sócrates, é que por pertencerem à elite política que acede a cargos governamentais já não se achem escrutináveis e pensem que os restantes portugueses são uns parolos que têm que ouvir (explicações risíveis e absurdas) e calar.
Mas também me incomoda que os seus correlegionários branqueiem atos vergonhosos, que condenariam se fossem cometidos por qualquer outro português.
Nuno Crato, o comentador político que há muitos anos deu aulas numa escola secundária e, depois disso, também leu uns quantos artigos sobre economia da educação, chegou a MEC com um discurso construído (e amplamente difundido nos media) de rigor e combate ao facilitismo.
Chegado ao governo atirou-se, que nem gato a bofe, ao programa de certificação e validação de competências dos CNO, exatamente em nome do combate ao facilitismo. Com isso conseguiu duas coisas:
paralisar um programa que certificava as competências adquiridas pelos portugueses que tinham abandonado a escola precocemente, mas que através do trabalho e do esforço de aprendizagem profissional demonstravam merecer a equivalência ao diploma do ensino básico e/ou secundário;
eliminar alguns milhares de horários de professores que, nas escolas públicas, lecionavam as componentes académicas que complementavam as experiências profissionais dos formandos, validando e valorizando assim as respetivas competências.
Mas que faz agora Nuno Crato, o ministro, face à comprovada (embora pouco clara) forma como uma universidade privada validou e certificou a experiência adquirida ao longo da vida pelo seu companheiro de governo Miguel Relvas?
Não só não se atreve a emitir a mais rasteirinha opinião, como vai colocando os grãos de areia suficientes na engrenagem para que as conclusões e consequências de qualquer investigação não atinjam o correlegionário político.
Admitindo que depois de 2009 não houve mais favores da Lusófona a nenhum estudante com amigos bem colocados, em eventuais processos de creditação bolonhesa, isso não valida os que se realizaram antes e, não sendo legalmente incorretos, são ética e moralmente condenáveis. Mas isso pouco interessa ao rigor crático, que apenas impõe a ética do estudo e do trabalho aos outros e a acha dispensável no caso dos que o rodeiam.
A notícia foi passando em rodapé nas televisões e tem honras de diversos posts blogosféricos, deixando vincada a insinuação de que o KKE sobrepõe “o seu espírito sectário” à unidade das esquerdas que permitiria governar a Grécia a caminho de uma “nova Europa”.
Infelizmente a história é outra e os números (percentagens e deputados) não concedem validade à teoria. É que Syriza (16,27%, 50 deputados) KKE (8,36%, 26 deputados) e Esquerda Democrática (6,04%, 18 deputados) ficam a 57 deputados da maioria absoluta. Mesmo que o Syriza estivesse em 1º lugar e arrecadasse os obscenos 50 deputados extra que esse lugar lhe daria, ainda ficavam a faltar 7 para que tal coligação pudesse governar.
Também não deixa de ser curioso que aqueles que por cá sonham com um “PS de esquerda” não considerem a possibilidade de se juntar aos “socialistas” lá do burgo – PASOK e continuem a apostar todas as fichas na cisão das fileiras alheias.
Como bem nota Manuel António Pina na sua crónica no JN, bastou que ao capital e às marionetas que governam a europa e o mundo em seu nome imaginar que um povo pode decidir o seu destino, sabendo claramente o que significam as suas escolhas, para que a democracia ficasse em perigo.
Quando há seis meses atrás os partidos da troika interna, sob a supervisão do FMI, do BCE e da “democrática” UE organizaram um referendo ao memorando de entendimento entre Portugal e a troika externa, sem explicar aos eleitores a dimensão dos sacrifícios que nos iriam ser pedidos – roubo dos salários, dos subsídios de natal e férias, aumento do horário de trabalho, aumento do IVA, destruição do SNS, da Escola Pública e dos serviços públicos de transportes – o resultado eleitoral foi amplamente glosado como uma rotunda vitória da responsabilidade e da democracia por mais de 80% de votos.
… a auto-promoção de António José Seguro a líder da oposição, à saída do encontro de hoje com Pedro Passos Coelho, faria sentido.
Acontece que alguém deveria ter avisado o chefe do PS que não lidera a bancada de deputados do PCP, e presumo que também não lidere a do BE, pelo que um pouco mais de humildade não lhe faria nada mal (mesmo quando sabe que a comunicação social e os comentadeiros aí instalados papam este tipo de discurso como a melhor iguaria do mundo)
António Silva, uma das figuras incontornáveis do teatro e cinema português do século XX, popularizou a expressão “Chapéus há muitos, seu palerma” numa cena memorável do célebre filme “O Leão da Estrela”.
Recordei-me da frase ao ler a notícia de hoje, em que o papa Bento XVI exortou os fiéis que o ouviam a munirem-se de um “radicalismo cristão” para combater a falta de fé. O que não deixa de ser curioso num tempo em que o “ocidente” continua a combater o radicalismo islâmico e em que, na Noruega social-democrata e civilizadíssima, um rapaz branco, alto, louro e de olhos azuis levou a cabo a chacina de dezenas de outros jovens, por discordar dos princípios da multiculturalidade que eles defendiam.
Desculpem-me ter que voltar à vaca fria, mas a edificante estória que li no ionline sobre confusão com o concurso de professores em DACL obriga-me a recordar as intenções pré-eleitorais do PSD e do CDS – acabar com a ADD kafkiana e os seus efeitos perversos.
Claro que depois de enganados os crentes, metidos os votinhos ao bolso e sentados os quadris nos cadeirões do poder, os nossos abnegados governantes são sempre confrontados com as agruras de uma realidade que os ultrapassa: ele é o défice que é muito mais colossal do que o previsto e obriga a decretar novos impostos e outros aumentos para ir ao bolso de quem trabalha; tal como é a descoberta de que a lei obriga a manter quotas que antes eram injustas, ou a manter asteriscos e outras bonificações que permitem fazer ultrapassagens miraculosas a quem foi visionário, ambicioso e colaboracionista o suficiente para pactuar com a tal ADD monstruosa e kafkiana, tendo tido a sorte de estar na escola certa no ano certo.
E no fim os tais esforçados ministros ainda podem contar com a inteligência complacente daqueles a quem extorquiram o voto com enganos, que encontram sempre uma qualquer teoria da conspiração que atira com o odioso da coisa para cima de um serviço ou de um funcionário que esteja a jeito por, alegadamente, ter sido responsável por ordens contraditórias esquecendo-se a responsabilidade política de quem faz opções e as põe em prática, quanto mais não seja por inacção.
Na sexta-feira dia 8 de Julho, ao final da tarde, o deputado do PCP Miguel Tiago anunciou à comunicação social que o grupo parlamentar do PCP iria apresentar um projecto de lei para revogar a ADD;
Na segunda-feira dia 11, cumprindo o anunciado, o grupo parlamentar entregou na AR o Projecto de Lei 12/XII;
A partir da divulgação da concretização da iniciativa diversos professores/bloguers, entre os quais se destacou claramente PG, decidiram que o projecto apresentado era um disparate porque padeceria de inconstitucionalidades semelhantes à do projecto aprovado em Março;
Como desde sempre ficou claro, e de resto consta do Projecto de Lei 12/XII, o princípio da negociação colectiva nunca foi posto em causa pela iniciativa (vide art. 2º – Processo de negociação colectiva), apesar de esse ter passado a constituir o novo argumento do ilustre interprete, quando o argumento anterior perdeu consistência;
Retomando uma velha brincadeira de juventude, entre a malta da minha rua, apetece-me dizer: deixá-los “falá-los” que eles “calarar-se-ão”, pobres diabos…
É que ao contrário do que o grande educador da classe docente acha e se atreve a escrever, o Projecto de Lei 12/XII não foi retirado e não foi chumbado na generalidade, tendo baixado à comissão que, ela sim, decidirá do mérito ou demérito da iniciativa.
Os fóruns em directo são um must em que os OCS apostam há bastante tempo, criando a ilusão de “dar voz ao povo”.
Tendo uma história longa, desde os “Fórum TSF”, a coisa foi-se estendendo às televisões por cabo onde também serve para encher a grelha de programação a baixo custo.
Se a coisa se ficasse pela ilusão da populaça quanto à eficácia da sua participação, não viria demasiado mal ao mundo. E até poderia servir para que os convidados pudessem introduzir uma dimensão de análise que fosse para além do discurso mainstream. Infelizmente, quer pela orientação e pelas perguntas do(s) jornalista(s) moderador(es), quer pela pressão do tempo em directo, é frequente que quem está em estúdio para comentar não consiga dizer o que podia fazer a diferença.
Mas o pior da “coisa” é a profunda incompetência dos jornalista(s)? que ouvindo ataques bárbaros a pessoas e instituições ausentes (e sem possibilidade de exercerem de imediato o contraditório) não são capazes de exigir fundamentação para esses ataques ou, de forma expedita, impedir que a acusação torpe tenha divulgação.
Foi uma situação desse teor que aconteceu no “Opinião Pública” transmitido ontem à tarde na SICN.
Logo no início do vídeo que se segue (a intervenção teve início um pouco antes, mas pertence a um outro excerto do programa) um encarregado de educação faz acusações de enorme gravidade a uma professora, nomeando-a e identificando a escola em que alegadamente terão ocorrido os factos que relata. A intervenção total ultrapassou os dois minutos de tempo de antena e o senhor acusou a professora de, além de ser incompetente, tratar os alunos de forma inaceitável, dizendo que cheiravam mal e eram uns porcos a ponto de, alegadamente, alguns terem medo de ir às aulas.
Perante este relato, que foi ouvido sem pestanejar pelo jornalista Pedro Cruz, nem uma questão foi colocada ao acusador. Pior ainda, no final o jornalista pediu desculpa por interromper e agradeceu a intervenção dizendo: «agradeço as dúvidas que aqui deixou e os casos concretos».
A dinâmica do programa, não permitindo um contraditório imediato, deixou que a ideia de que há professores que tratam mal os alunos, não lhes ensinam o que devem e, ainda por cima, os insultam. De facto, entre o minuto 02:00 e o minuto 13:25 foram ditas inúmeras coisas, mas nenhuma voltou a por em causa as acusações feitas. E apenas nesse momento, ao minuto 13:25, o convidado fez uma pequeníssima alusão ao ataque do encarregado de educação. Infelizmente fê-lo de forma muito superficial e que terá ficado pouco clara para a generalidade da audiência, o que é explicável pela pressão do tempo disponível para abordar e sintetizar as opiniões e críticas feitas pelos espectadores.
No fundo, nada que não corresponda ao objectivo populista e irresponsável deste tipo de fóruns – dar a ideia à populaça de que a sua voz é ouvida e que podem denunciar os “pequenos poderes” que a oprimem.
Declaração de interesses:
Conheço todos os protagonistas deste episódio lamentável. Conheço o senhor que falou, fui professor e director de turma do seu educando há alguns anos e sou colega da professora nomeada;
Não pretendo fazer qualquer juízo de valor sobre o conteúdo das alegações do senhor José Loureiro, e muito menos os faria em público e neste blogue;
Nem professora nomeada no programa de ontem nem a direcção da escola que também foi identificada tinham conhecimento das acusações até que eu próprio apresentei o caso hoje de manhã;
A professora em causa não é sindicalizada e, como tal, o sindicato de que sou delegado nesta escola não está em condições de a representar, caso ela pretenda agir contra o senhor que a acusou publicamente;
Da conversa que tive com a direcção da escola retirei a conclusão de que iniciará de imediato diligências para averiguar o sucedido, quer ontem durante a transmissão do programa, quer as alegações do encarregado de educação;
Posso também acrescentar que, de acordo com a informação que me foi dada hoje de manhã, nunca a direcção do Agrupamento José Cardoso Pires teve conhecimento de qualquer das situações que ontem foram relatadas pelo senhor José Loureiro no programa da SICN – Opinião Pública.