Etiquetas
Na proposta entregue por Nuno Crato aos sindicatos de professores há uma omissão positiva e uma novidade destinada a obter o apoio de uma parte significativa dos professores no activo.
A omissão positiva é a que se refere ao fim das bonificações para efeitos de concursos de professores associadas às classificações de Excelente e Muito Bom. Pode aplaudir-se esta medida, esperando que não seja retomada em sede de legislação sobre concursos.
A novidade é a isenção de avaliação para os professores do 8º e 9º escalões (actualmente não há ninguém no 10º). Trata-se de uma medida que visa diminuir o número de eventuais contestatários, retomando (sem o explicitar) o conceito de professor titular.
Independentemente de cada um se sentir beneficiado ou prejudicado com estas duas medidas, uma coisa fica clara – trata-se de diminuir o número de professores a avaliar, reduzindo o número de aulas a observar e atenuando a pressão sobre a formação da bolsa de avaliadores.
Isto traduz-se em redução da despesa com estes professores-avaliadores e decorre do facto de Nuno Crato ter uma visão da educação em que a prestação de contas se deve centrar nos resultados e não nos processos. Desse ponto de vista pouca importância atribui à observação das aulas e o seu modelo só verá a luz do dia no dia em que instituir exames a todas as disciplinas, de preferência em todo os anos de escolaridade, i.e., no dia de sãonuncàtarde.
O objectivo da avaliação do desempenho dos professores sempre foi o de conter despesas a nível da sua progressão na carreira. E vai continuar a ser.
O processo está inquinado à partida.
Denunciar isto é importante, mas tarefa difícil.
Relativamente ao fim das bonificações para efeitos de concursos de professores, ainda é cedo para se chegar a quaisquer conclusões. Teremos de aguardar pelas negociações dos sindicatos com o Governo e depois pela legislação sobre concursos.
Já em relação aos resultados, julgo que são importantes, em particular, a forma como evoluem. Não existem resultados puros: eles reflectem sempre os processos (porque os processos visam a obtenção de um resultado). Pela qualidade dos frutos se vê a qualidade da árvore.
Os resultados e a assiduidade dos docentes são dois elementos fundamentais que, a meu ver, a ADD deverá contemplar.
Quanto às aulas assistidas, penso que não devem ser sobrevalorizadas. A aula é um espaço de liberdade. É um atentado à liberdade, a invasão da sala de aula pelos avaliadores. Aliás, é condicionadora do ensino prestado naquele momento, em que o professor está a ser atentamente observado. Além disso, e mais importante, toda a gente sabe que duas ou três aulas assistidas por ano apenas permitem ver a ponta do “iceberg” e não o “iceberg” todo, se é que permitem ver alguma coisa.
Mas julgo que o maior regozijo para os defensores das aulas assistidas seria a colocação de um “olho electrónico” dentro da sala de aula (uma espécie de “Big Brother”) e uma buzina que tocasse sempre que o professor fizesse algo em desacordo com algum livrinho de regras, escrito por algum iluminado. É um pesadelo, mas infelizmente, parece que lá chegaremos um dia, por este andar.
De resto, concordo com a comentadora Fernanda quanto principal objectivo escondido que ela aponta para a avaliação do desempenho dos professores.
A este objectivo de poupança da avaliação de desempenho (ADD), está implícito outro objectivo – o de continuar a dividir os professores e o de menosprezar a sua actividade profissional.
O modelo conceptual é uma enorme farsa e a sua aplicabilidade, como se entende logo na primeira leitura da proposta de modelo, vai trazer mais dúvidas e confusões.
Nunca tive dúvidas de que as medidas tomadas desde MLR até agora e as que se seguirão tiveram e terão objectivos economicistas, pelo que é difícil não considerar hipocrisia os discursos sobre a qualidade do ensino na Escola Pública. No entanto, quanto ao ponto da proposta de ADD que dispensa da avaliação os professores dos últimos escalões, se eu fosse capaz de acreditar que o MEC e Nuno Crato pensam a médio e longo prazo e não apenas em conter despesas a curto prazo, até acharia certo que, depois de várias avaliações todas com Bom, viessem a ser dispensados. Mas foram os governantes dos partidos do “arco da governação” mais os seus amigos ditos independentes que criaram e legitimaram o descrédito ou a desconfiança quando lemos as suas propostas.