Numa altura em que se começa a ver uma ténue luzinha ao fundo do túnel, começando a admitir-se a consistência da substituição do monstro avaliativo de MLR, convém perceber que o novo modelo será mais ou menos adequado aos objectivos enunciados e aos interesses dos profissionais, em função da unidade com que a classe surgir perante a tutela. Por isso não se percebe se é ironia ou sinceridade a preocupação com o juízo dos dirigentes sindicais.
É nestas alturas que se torna útil o recurso às “fontes arqueológicas” que nos remetem para um texto «não divulgado em nenhum outro espaço» e que, entre outras coisas que eram adequadas à época, deixava um apelo de grande utilidade também nos tempos que correm:
«É preciso mostrar ao país que sindicatos e professores são um só! Fica o apelo! Aos sindicalizados e aos não sindicalizados! Fica o apelo a todos aqueles que se sentem violentados e injustiçados com o actual Estatuto da Carreira Docente, com a nova Avaliação do Desempenho, com os Concursos a Titulares…com todas as reformas implementadas por uma alma sinistra a quem as novas gerações, um dia, deviam pedir responsabilidades! Os professores têm de decidir!
Os professores só sairão derrotados quando desistirem! E tu, que és professor, o que resolves? Qual a tua atitude? Lutas ou desistes? Lutas ou calas-te? E lutas sozinho ou dás as mãos a outros como tu? Tu decides! E, garanto-te, a Senhora Ministra está ansiosa por saber se pode contar contigo…»
Com a devida vénia ao Matias Alves e a Ana Paula Silva, professora de Filosofia e autora do texto que “tomei emprestado” do Terrear, fica uma reflexão serena e necessária nestes tempos de elogio da medida, da comparação e da meritocracia mistificadora:
Sou professora, mas hoje escrevo como mãe. Uma mãe que tem uma filha, que desde ontem se encontra em “estado de choque”. Ser professora e mãe constitui um dos maiores desafios à gestão clarividente de uma pluralidade de estatutos. Não são incompatíveis mas são complicados de compaginar. Que o digam minhas filhas….. Em relação à sua vida escolar sou, “por defeito profissional”, sempre vigilante em relação à pontualidade, à assiduidade e sobretudo ao estudo. Não, de uma forma opressiva ou controladora, mas sempre tentando sensibiliza-las que nada se consegue sem trabalho e estudo.
Ontem a realidade dos factos, disse à minha filha mais nova que eu lhe menti. Aluna com média de 17 valores, a Inês nos doze anos de escolaridade, nunca teve nenhuma dificuldade grave a qualquer disciplina, embora fosse fácil perceber as áreas disciplinares da sua preferência. Português e História são as suas disciplinas de eleição. Disciplinas a que sempre tirou notas acima da média. Desde sempre. No três anos do curso complementar, com professores diferentes, em ambas as disciplinas a sua média de aproveitamento foi 17.
Claro que, com mãe professora e professoras preocupadas, o fantasma dos exames nacionais, era recorrentemente invocado, para não descurar os estudos ou quando preparava um testes de avaliação. Mas sem fundamentalismos, afinal é uma aluna regular e responsável. O último teste de português de preparação para exame (disciplina que elegeu como “chave de entrada “no ensino superior) realizado – aquele que foi feito no exame do ano anterior – tirou 19 valores e ganhou o elogio da professora que a conhece e sabe o que vale, através de um ano de relação pedagógica . E , apesar da ansiedade , ficou optimista.
Uma média de 17, numa escola pública considerada de referência, com professores muito experientes e competentes, a Inês deveria ir calma para os exames. Mas não foi. Minutos antes do teste de Português, vomitou. Aquando do de Historia tremia de frio, num dia quente. Resultado 1 : 9 valores em ambos. Resultado 2: Agora com média de 16, não pode entrar em nenhuma faculdade, pública ou privada (precisaria de 9,5 – mais méia décima portanto) Porque sou professora do 12ºano, poderia traçar aqui considerações acerca da desadequação metodológica que , na minha opinião, subjaz à elaboração de alguns testes de exame, sobre a putativa concertação de critérios de avaliação que ,na maior parte dos casos não aconteceu , ou sobre outras reflexões que estes exames me sugerem ,mas vou abster-me dessas considerações.
Vou a penas deixar algumas questões ao Sr. Ministro de Educação a quem ainda ontem ouvi, presencialmente , louvar as potencialidades curativas dos exames nacionais que aparecem como a medida emblemática da sua “implosão” transformadora do Ministério da Educação: • Doze anos de escolaridade de boa aprendizagem com provas dadas e comprovadas por dezenas de professores são insuficientes para saber se um aluno pode ou não seguir para o ensino superior ? Padecerão todos estes professores de miopia avaliativa? • È mais fiável deixar essa decisão para a avaliação externa de alguém que classifica provas, sobretudo as que, pela natureza da disciplina são de um enorme grau de subjectividade, e cuja interpretação de critérios avaliativos (mesmo quando é feita) é (muito) contingente?
• Somos um país impede que um jovem com 18 ou mesmo 18,5 valores siga o seu sonho de ser médico , que lhe “atira à cara” que o seu esforço foi NADA, que lhe diz : não precisamos de ti mesmo quando mostraste que soubeste lutar por esse sonho. ( E depois oferece aos seus cidadãos os médicos que os seus países de origem não quiseram ou não souberam manter). Tive alunos que não entraram em medicina por centésimas!!! Não seria mais honesto dizer a estes jovens que estudar e trabalhar é muito pouco , pois os exames é que decidem se ele pode ser ou não aquilo que vai ser um estudante mediano de outro pais ( e sendo estrangeiro já é suficientemente bom para ser médico em Portugal, nem que os seus doentes não percebam nada do que diz ) ?
• Que tipo de País tem a coragem de dizer a um/a jovem que (mesmo com uma prestação infeliz em exame)tem uma média de aproveitamento de 16 valores que não pode seguir em frente? Como tem a coragem de lhe dizer que o seu estudo, trabalho e esforço foi um logro?
Em Rodapé: Ontem estive numa das extraordinárias iniciativas da Universidade Católica em prol do sucesso dos alunos, onde vi e ouvi centenas de professores testemunharem a sua dedicação, o seu trabalho e a sua preocupação pelo sucesso dos alunos. Senti que esse era o caminho. O Sr. Ministro da Educação só chegou depois de tudo dito e no que disse depois , perdeu-se, sobretudo, em elogios sobre a importância extraordinária dos exames . E os professores bateram palmas. E eu pensei : Devo estar distraída (ou caduca). Então não se esteve horas a valorizar a diferença, a aprendizagem contínua , a avaliação consertada ? A demonstrar como o rigor nasce do trabalho que é posto à prova todos os dias da relação pedagógica? E não foram sentidas as nossas palmas? Agora vem o Sr. Ministro e diz-nos que não ; o rigor só tem um nome e chama-se exame nacional; e todos os professores batem palmas outra vez !!!! A classe mais qualificada deste país bate palmas a uma coisa e ao seu contrário? ?? !!!! E eu pensei: 30 anos de carreira não são suficientes para perceber esta simples equação (que o Sr. Ministro perceberá porque é de Matemática ) : Como coisas tão diferentes podem significar a mesma coisa ? Como uma coisa pontual, contingente , única e anónima pode significar o mesmo que anos de trabalho, de conhecimento, de proximidade? E Então pensei melhor: Vai mas é para casa e tenta explicar à tua filha que ter sonhos neste pais é um privilégio apenas para ministráveis.
Por mais estardalhaço que os eternos maldizentes, secundados por uns quantos eternos ignorantes, continuem a fazer para denegrir o trabalho sindical da Fenprof, a verdade é que a listagem de prioridades a solucionar, que ontem foi entregue ao ministro da educação, contém as questões que são essenciais para normalizar a vida nas escolas e permitir que o próximo ano seja mais calmo e produtivo.
Evidentemente que pode haver professores que não querem ser representados por sindicatos que lutam pelos direitos da classe, ao mesmo tempo que se preocupam com a defesa de uma escola pública para todos e que não se destine a reproduzir as desigualdades sociais. Deveriam ser consequentes e coerentes, recusando-se a usufruir de eventuais benefícios dos acordos a estabelecer entre o governo e os sindicatos, declarando que preferem manter a sua situação actual.
Claro que poderia não ter começado este post da forma como o fiz. A verdade é que embora podendo, não seria a mesma coisa.
Dito isto, aqui ficam as reivindicações que a delegação da Fenprof entregou ontem à tutela:
Suspensão imediata e substituição do regime de avaliação de desempenho
Revisão de normas sobre a organização do próximo ano lectivo e a elaboração dos horários de trabalho dos docentes
Reformulação do processo de reorganização da rede escolar
Garantia de mobilidade nacional dos docentes que se encontram colocados nas regiões autónomas
Correcção das ilegalidades criadas recentemente aos docentes contratados
Regularização das situações de carreira dos docentes *
Reconhecimento da avaliação de desempenho dos docentes realizada nas Regiões Autónomas
Antecipar, para 2012, o concurso de ingresso e mobilidade nos quadros previsto apenas para 2013
Regularização das situações de exercício de funções docentes no Ensino Superior
Relativamente a outros aspectos fundamentais para a promoção do sucesso e da qualidade educativa e para combate ao abandono escolar, a FENPROF propõe, para que se desenvolvam os normais processos negociais ao longo do ano 2011/2012:
Debate que permita a realização de uma verdadeira reorganização curricular
Revisão global de programas e dos próprios modelos de avaliação dos alunos
Alteração do regime de autonomia e gestão das escolas
Valorização do Estatuto da Carreira Docente
Revisão e valorização dos regimes de formação inicial, contínua e especializada de docentes
Revisão do Decreto-Lei n.º 3/2008, sobre Educação Especial
Revisão do regime de financiamento do Ensino Superior
Debate público sobre a reorganização da rede de ensino superior público
Regime de contrato e de carreira a aplicar aos docentes do ensino superior privado e garantia de aplicação do ECDU aos docentes em exercício nas fundações
“ULTRAPASSAGEM” DE PROFESSORES NA CARREIRA – DOCENTES COM MAIS ANTIGUIDADE VENCEM POR ÍNDICE INFERIOR
DOCENTES IMPEDIDOS DE PROGREDIR ATÉ 31 DE DEZEMBRO DE 2010 POR RAZÕES ALHEIAS À SUA VONTADE – M.E. NÃO ESTABELECEU CONTINGENTAÇÃO
TRANSIÇÃO DE DOCENTES INTEGRADOS NO 1.º ESCALÃO DA CARREIRA DO ÍNDICE 151 PARA O 167
ORIENTAÇÕES DO M.E. SOBRE APLICAÇÃO DO REGIME DE AVALIAÇÃO
AUSÊNCIA DE REGIME AVALIATIVO PARA DOCENTES EM MOBILIDADE A 100% QUE, POR ESSA RAZÃO, FORAM IMPEDIDOS DE PROGREDIR NA CARREIRA, PERDERAM TEMPO DE SERVIÇO, PARA ALÉM DE OUTRAS PENALIZAÇÕES
ÍNDICE SALARIAL DOS DOCENTES CONTRATADOS PROFISSIONALIZADOS – INTEGRAÇÃO NO ÍNDICE 167
PROCESSAMENTO DE HORAS EXTRAORDINÁRIAS AOS DOCENTES
Os fóruns em directo são um must em que os OCS apostam há bastante tempo, criando a ilusão de “dar voz ao povo”.
Tendo uma história longa, desde os “Fórum TSF”, a coisa foi-se estendendo às televisões por cabo onde também serve para encher a grelha de programação a baixo custo.
Se a coisa se ficasse pela ilusão da populaça quanto à eficácia da sua participação, não viria demasiado mal ao mundo. E até poderia servir para que os convidados pudessem introduzir uma dimensão de análise que fosse para além do discurso mainstream. Infelizmente, quer pela orientação e pelas perguntas do(s) jornalista(s) moderador(es), quer pela pressão do tempo em directo, é frequente que quem está em estúdio para comentar não consiga dizer o que podia fazer a diferença.
Mas o pior da “coisa” é a profunda incompetência dos jornalista(s)? que ouvindo ataques bárbaros a pessoas e instituições ausentes (e sem possibilidade de exercerem de imediato o contraditório) não são capazes de exigir fundamentação para esses ataques ou, de forma expedita, impedir que a acusação torpe tenha divulgação.
Foi uma situação desse teor que aconteceu no “Opinião Pública” transmitido ontem à tarde na SICN.
Logo no início do vídeo que se segue (a intervenção teve início um pouco antes, mas pertence a um outro excerto do programa) um encarregado de educação faz acusações de enorme gravidade a uma professora, nomeando-a e identificando a escola em que alegadamente terão ocorrido os factos que relata. A intervenção total ultrapassou os dois minutos de tempo de antena e o senhor acusou a professora de, além de ser incompetente, tratar os alunos de forma inaceitável, dizendo que cheiravam mal e eram uns porcos a ponto de, alegadamente, alguns terem medo de ir às aulas.
Perante este relato, que foi ouvido sem pestanejar pelo jornalista Pedro Cruz, nem uma questão foi colocada ao acusador. Pior ainda, no final o jornalista pediu desculpa por interromper e agradeceu a intervenção dizendo: «agradeço as dúvidas que aqui deixou e os casos concretos».
A dinâmica do programa, não permitindo um contraditório imediato, deixou que a ideia de que há professores que tratam mal os alunos, não lhes ensinam o que devem e, ainda por cima, os insultam. De facto, entre o minuto 02:00 e o minuto 13:25 foram ditas inúmeras coisas, mas nenhuma voltou a por em causa as acusações feitas. E apenas nesse momento, ao minuto 13:25, o convidado fez uma pequeníssima alusão ao ataque do encarregado de educação. Infelizmente fê-lo de forma muito superficial e que terá ficado pouco clara para a generalidade da audiência, o que é explicável pela pressão do tempo disponível para abordar e sintetizar as opiniões e críticas feitas pelos espectadores.
No fundo, nada que não corresponda ao objectivo populista e irresponsável deste tipo de fóruns – dar a ideia à populaça de que a sua voz é ouvida e que podem denunciar os “pequenos poderes” que a oprimem.
Declaração de interesses:
Conheço todos os protagonistas deste episódio lamentável. Conheço o senhor que falou, fui professor e director de turma do seu educando há alguns anos e sou colega da professora nomeada;
Não pretendo fazer qualquer juízo de valor sobre o conteúdo das alegações do senhor José Loureiro, e muito menos os faria em público e neste blogue;
Nem professora nomeada no programa de ontem nem a direcção da escola que também foi identificada tinham conhecimento das acusações até que eu próprio apresentei o caso hoje de manhã;
A professora em causa não é sindicalizada e, como tal, o sindicato de que sou delegado nesta escola não está em condições de a representar, caso ela pretenda agir contra o senhor que a acusou publicamente;
Da conversa que tive com a direcção da escola retirei a conclusão de que iniciará de imediato diligências para averiguar o sucedido, quer ontem durante a transmissão do programa, quer as alegações do encarregado de educação;
Posso também acrescentar que, de acordo com a informação que me foi dada hoje de manhã, nunca a direcção do Agrupamento José Cardoso Pires teve conhecimento de qualquer das situações que ontem foram relatadas pelo senhor José Loureiro no programa da SICN – Opinião Pública.
Ele há coincidências do caraças. E demagogos populistas que coincidem no discurso e, ainda por cima, no tempo em que o produzem. Claro que há sempre alguém que, com extrema argúcia e grande sentido de oportunidade, não perde a ocasião para amplificar a bordoada nessas organizações que tanto custam ao país e tanto atrapalham quem só quer trabalhar e apresentar serviço.
Quanto às coincidências, vamos aos factos:
Pela madrugada (00h30) o JN online publicou uma crónica do bastonário da ordem dos advogados, em que Marinho Pinto se atira às despesas do OGE com os partidos políticos. Sem ter a coragem de dizer que preconiza o fim do financiamento público do sistema democrático, o bastonário utiliza uma retórica demagógica e populista em que demoniza a subvenção que os partidos recebem, de acordo com os resultados eleitorais, porque a sociedade acha melhor e mais democrático sermos governados por cidadãos eleitos do que pelos CEO’s dos grandes grupos económicos ou, mais prosaicamente, por uns quaisquer “patos-bravos” com contas abertas em off-shores.
Também pela manhã o enorme vulto do pensamento educativo, e estrénuo defensor da Ordem dos Professores, que dá pelo nome de Rui (sem y) Baptista (com p) publicou um post em que se penaliza por ter deitado para o lixo um artigo “brilhante” da não menos “brilhante e preclara” Helena Matos. E penaliza-se, o insigne Rui Baptista, porque nesse artigo, agora conspurcado nalguma montureira, se explica quanto custa ao erário público ter um sindicalismo independente do poder governamental e não controlado pelos interesses económicos.
Efectivamente, para estes orfãos da outra senhora, é incompreensível que o legislador ainda não tenha desmantelado por completo essas conquistas comezinhas trazidas pela Revolução de Abril.
É por isso que, enquanto desesperam pela chegada do homem providencial que reponha a autoridade, lamentam cada cêntimo gasto com a liberdade e a defesa dos direitos dos cidadãos em busca da justiça e da igualdade social.
Quem terá sido o autor da frase: «não estou para fingir que acredito numa verdadeira liberdade de expressão em órgãos de comunicação, só porque têm uns fóruns online no canto do seu site e nomeiam alguém como “provedor do leitor”.»?
Dicas:
já é coisa antiga (de acordo com a velocidade da sociedade mediática em que vivemos);
é possível confirmar o rigor e a autoria da frase, porque está publicada;
o autor é considerado uma referência no ramo, quiçá nalgum dos ocs a que se refere na frase.
A notícia que dei ontem, de que a proposta do PCP vai ser discutida e votada no próximo dia 27, provocou entre os professores que frequentam a blogosfera docente reacções diferentes e, nalguns casos, bastante curiosas.
Se em muitos casos a reacção foi de satisfação (com maior ou menor comedimento, porque os partidos que apoiam o governo podem mudar o sentido de voto em relação a Março), o caso do Paulo Guinote e de uns quantos seguidores mais fundamentalistas configura o desespero absoluto, por terem percebido que a iniciativa é meritória e pode dar o empurrão definitivo para o enterro do monstro que MLR deu à luz em 2008. E permitir que o PCP e a FENPROF tenham razão e encontrem a solução para um dos problemas dos professores é coisa com que estes quixotes do séc. XXI não se conformam.
Para esta espécie de “gauleses contra os comunistas” todo e qualquer argumento serve desde que se situe na linha da ridicularização das ideias defendidas pela FENPROF. Até o argumento da defesa dos direitos de negociação que a federação exige e dos quais não abdicará, em circunstância alguma, serve para lançar a confusão na cabeça de gente pouco informada e que parece avessa a ler os originais preferindo ficar-se pela manipulação de “tradutores de meia-tigela”, que usam a má-fé para retorcer declarações alheias.
No fundo tudo se resume a que Paulo Guinote acha que é o especialista supremo em matéria de direitos dos professores, certificação dos direitos de representação da classe e produção de um discurso passível de ser veiculado para a opinião pública. Se alguém tiver o “topete” de avançar com alguma ideia que perturbe este status quo, logo o Guinote se levanta e arrasta atrás de si a turba ignara (mas bem amestrada) fazendo um chavascal blogosférico de todo o tamanho. E isso claro que é notícia!
Por isso, e porque a perspectiva da tença ainda não se esboroou por completo, o Guinote ontem tinha que mostrar serviço. Mais uma vez bem que se esforçou inventando argumentos, e percorrendo algumas linhas discursivas paralelas, à medida que as falácias iam sendo desmontadas. Regista-se o esforço e dedicação à causa. Creio que os olheiros laranjas estarão atentos.
De resto Paulo Guinote ainda teve, a certa altura, o consolo de um sindicalista assumidamente amarelo. O Arlindo veio em defesa do desesperado, trazendo para cima da mesa a novidade de que antes de dia 27 o governo irá resolver o problema da ADD.
Novidade das antigas, só perceptível por mentes iluminadas e superiores. Principalmente quando isso dá jeito para “fugir com o rabo à seringa”.
Vejamos então onde está o problema desta linha argumentativa:
Se formos pelo lado da “negociação” sindical (mesmo colando-nos como lapas aos formalismos da coisa) descobre-se que tanto a FENPROF como a FNE e todos os restantes sindicatos de professores têm nas suas reivindicações o fim da ADD. Donde não se percebe como se irão opor à iniciativa de retirar do ECD os artigos que criaram o monstro.
Para quem se preocupa em andar informado, não se contentando com o que alguns manipuladores de opinião lhe dizem, é possível ler o que a FENPROF perguntou a todos os partidos antes das eleições e o que estes responderam. No que à ADD diz respeito, porque se trata de matéria verdadeiramente instrutiva para analfabetos políticos, aqui fica o que está publicado:
Claro que se formos pelo lado da jurisprudência nos deparamo com os protestos sistemáticos da CGTP e da FENPROF em relação à alteração de legislação laboral, com agravamento das condições de vida dos trabalhadores, feita por via parlamentar e/ou governamental, sendo sistematicamente rejeitadas as providências cautelares e os pedidos de impugnação apresentados pelos sindicatos.
Se é verdade que em relação ao segundo ponto uma má jurisprudência não faz uma boa lei, já no que diz respeito à primeira questão, há muito que todos os partidos (e o governo) sabem o que é que os sindicatos e os professores que eles representam querem.
Agora, com esta posição do Paulo Guinote e de mais uns quantos acólitos, ficou-se a saber o que é que os que não querem ser representados pelos sindicatos pretendem – continuar a farsa (se possível com uns convites para jantar, ou petiscar qualquer coisita).
No título deste post utilizo o termo facilitismo com a intenção de demonstrar que ele pode ser mais facilmente associado à solução mágica dos exames do que ao princípio republicano da escola para todos.
O termo facilitismo remete-nos para o acto de facilitar algo que por natureza é difícil e custoso, exigindo normalmente grande esforço para ser realizado.
No discurso “crático”, que se caracteriza por um forte apelo ao populismo e à demagogia, os exames surgem como uma espécie de garantia de que o ensino é rigoroso e o trabalho de aprendizagem que os alunos têm que fazer é exigente pois, caso contrário, os resultados serão negativos, os alunos chumbarão e os professores poderão ser responsabilizados pelo insucesso.
Este é um discurso populista e demagógico porque, ao fazer apelo ao senso comum e ao modelo em que se formaram e reproduziram as elites que hoje governam, opinam e ensinam, surge como música harmoniosa aos ouvidos do mainstream.
Este discurso surge normalmente associado a uma comparação distorcida entre realidades completamente opostas, como são as que enformam a ideia de uma escola destinada a seleccionar e garantir a reprodução das classes sociais dominantes, por oposição a um modelo de escola em que todas as crianças, jovens e adultos não escolarizados têm acesso ao conhecimento e à diversidade cultural.
Esperar que a escola torne iguais as condições de sucesso entre alunos provenientes de classes sociais diferentes, sem tornar iguais, ou pelo menos semelhantes, os direitos de acesso aos bens essenciais – alimentação, saúde, rendimento disponível, segurança social, etc. – é mais do que uma utopia, uma enorme barbaridade e mistificação da realidade.
Esperar que os exames sejam o instrumento dessa transformação social é uma aldrabice que se destina a justificar a perpetuação da função selectiva da escola, a menos que esse instrumento só se aplique depois de garantidas as condições de igualdade que não existem.
Chegados aqui podemos afirmar que o conceito de escola pública para todos é algo de muito exigente, não tanto para os professores que nela trabalham ou para os alunos que nela aprendem. Uma escola para todos é altamente exigente para a sociedade como um todo, em particular para os decisores políticos e para quem tem a incumbência de coordenar as políticas educativas.
A exigência e o rigor de que falo, fazendo um apelo a toda a sociedade, só podem obter resposta com um esforço colectivo para proporcionar a todos os cidadãos a satisfação das suas necessidades básicas, para que passe a haver disponibilidade para uma focagem nas necessidades de um grau superior (Maslow).
O recurso aos exames, sem que o caminho anterior esteja percorrido, é tudo menos justo e equitativo. Pior do que isso, pode ser extremamente prejudicial para a sociedade ao permitir que crianças e jovens sejam excluídos apenas porque os handicaps sociais de que são portadores os impedem de obter o mesmo sucesso escolar.
Não se pode esperar que um aluno filho de desempregados, sem acesso a bens culturais, sem acesso a um computador e à Internet sem ser na escola e em condições precárias, obtenha os mesmos resultados em exames do que o filho de pais da classe média/média alta, bem nutrido, com acesso a cuidados de saúde privada, Internet, 200 canais por cabo, férias no estrangeiro, visitas a museus, teatro e cinema e uma estante repleta de livros com clássicos portugueses e estrangeiros.
Recorrer aos exames para exigir trabalho, sem antes cuidar dessas desigualdades, isso sim é facilitismo porque facilita a tarefa dos governantes que têm a obrigação de olhar as políticas públicas de uma forma integrada e não exclusivamente sectorial.
Facilitismo é não cuidar da justiça social e da equidade. Facilitismo é recorrer a uma retórica populista e demagógica, em vez de meter mãos à obra e corrigir as desigualdades sociais que aprofundam a divisão entre os muito ricos e os que quase nada têm.