O 1º ministro, que os portugueses escolheram pela 2ª vez consecutiva, é um indivíduo com algumas qualidades e também muitos defeitos.
Entre as qualidades interessa-me destacar a ambição e o sentido de oportunidade, ao passo que nos defeitos, para efeito desta análise, quero destacar a falta de escrúpulos e o pouco respeito pela inteligência de quem se lhe opõe. Poderia escolher outras características, mas é à luz destas que quero explicar a necessidade da oposição, dos sindicatos e dos professores forçarem uma solução rápida para o impasse relativo ao ECD e à ADD.
Na verdade, a partir da altura em que enveredou pela legislação simplex da ADD, o nosso 1º sabe que é uma questão de tempo (mais mês menos mês) e todo o seu projecto legislativo sobre o estatuto socioprofissional dos professores “vai pelo cano”, como diriam os nossos primos brasileiros.
Acontece que Pinto de Sousa é um homem ambicioso, a quem não chegam umas migalhas de poder. Já foi o tempo… agora, desde que conseguiu desalojar Ferro Rodrigues do poder no PS, só o mando no país o satisfaz.
Quando, durante o ano de 2008, foi confrontado com a impossibilidade de vencer a luta dos professores, Pinto de Sousa arquitectou um plano: servir-se de quem o afrontou, de forma tão clara, para reforçar o seu poder sobre todos. Num primeiro momento pensou que mostrando firmeza contra uma classe (que avaliou de forma deficiente, por tê-la menosprezado), poderia retirar dividendos eleitorais.
Mas a firmeza da nossa luta, associada à justiça das nossas reivindicações e à unidade mantida pelos nossos representantes, acabaram por lhe gorar esse 1º plano. Aos poucos, na opinião pública e depois na opinião publicada, a simpatia para com os professores foi aumentando na medida inversa da popularidade do nosso 1º.
Foi então que a crise económica internacional começou a bater mais forte à porta dos portugueses. Ao mesmo tempo que as eleições se aproximavam e o PS ia caindo nas intenções de voto. Pinto de Sousa começou então (já 2009 se ia adiantando no calendário) a usar-nos para distrair os portugueses de outras incompetências do seu governo. Cada vez que a comunicação social falava da luta dos professores (coisa antiga de mais de um ano), não tinha espaço para falar do código do trabalho da precariedade laboral, das negociatas pouco claras entre o Estado e alguns empresários, ou da justiça lenta e ineficaz que paralisa o país.
Até que chegámos a Setembro e, mesmo com todas estas artimanhas, Pinto de Sousa se viu desapossado do seu poder absoluto sobre a Assembleia da República. E isso, para um homem da sua ambição e egocentrismo, é algo inaceitável. Ainda por cima quando a conjuntura económica exige negociação, rigor e trabalho cooperativo.
Mas o nosso 1º tem outra agenda, que pensa lhe poderá restituir o quinhão de poder perdido.
Para isso redesenhou a sua estratégia de intervenção: vai continuar a mostrar uma face humanizada e passar, para a comunicação social domesticada, a imagem de um estadista responsável e dialogante, ao mesmo tempo que dará instruções aos seus peões de brega para empatarem as negociações sobre os professores.
Dessa forma continuará a mostrar a firmeza que os portugueses tanto apreciam, desde os tempos do Marquês de Pombal, passando por João Franco, Sidónio, Salazar e Cavaco, ao mesmo tempo que bloqueia a agenda comunicacional, evitando que se fale de outros dossiers de maior importância para os portugueses, como o desemprego, os atrasos na justiça, ou a corrupção, que continua a alastrar porque isso beneficia o financiamento partidário e aconchega as contas bancárias de redes mafiosas que se apoderaram do Estado em proveito próprio.
É para evitar que esta estratégia de um governo que não quer governar, mas apenas manter o poder, que é urgente acabar com este dossier do ECD e da ADD. Começar negociações entre o ME e os Sindicatos pode ser um passo importante. Mas é necessário que todos os sindicatos avaliem com rigor e objectividade se as rondas negociais se destinam a resolver os problemas, ou se apenas se destinam a empatar e a transformar Pinto de Sousa numa vítima dos professores.
Caso seja essa a situação, será necessário que todos os partidos da oposição cumpram o seu compromisso, resolvam o problema de vez e, em seguida, exijam que o governo se concentre na governação, em vez de continuar a fazer de conta.