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A discussão sobre o alargamento da escolaridade obrigatória até aos 18 anos, ou até ao 12º ano (o que não é a mesma coisa), promete tornar-se numa “reprise” do que sucedeu há 20 anos com o alargamento até aos 15.

A decisão política de impor uma escolaridade básica obrigatória de 9 anos, tomada em 1986, deveria ter garantido que todos os portugueses que entraram no sistema a partir da aprovação da LBSE tivessem concluído, com aproveitamento, o 9º ano (sabemos que isso não é verdade e o próprio governo o reconheceu ao introduzir as Novas Oportunidades).

A questão será a de saber se a decisão actual enferma ou não dos mesmos erros e voluntarismos de que padeceu a anterior decisão de alargamento.

Devo acrescentar que sou de opinião que é melhor ter todas as crianças e jovens escolarizadas, do que ter apenas uma elite na escola e a grande massa como trabalhadores precoces e não qualificados.

Na passada quinta-feira, no discurso de abertura do X Congresso da SPCE, em Bragança, MLR anunciou que o governo tinha aprovado nesse dia o diploma que determina o alargamento da escolaridade obrigatória até ao 12º ano.

Na sua intervenção a ministra declarou que não considera esta medida de alargamento especialmente inovadora, acrescentando que, do seu ponto de vista, a grande reforma terá sido o alargamento até ao 9º ano, decidido na LBSE.

No entanto, ao fazer o diagnóstico do que se passou, MLR acabou por tornar muito mais claro o seu pensamento autoritário e o voluntarismo em que assenta a sua forma de decisão política.

MLR identificou como causa do “fracasso” e do atraso com a que medida tomada em 1986 acabou por se concretizar, o facto de não se ter feito nessa altura uma “quebra de contrato” entre a Escola e os professores, uma vez que a missão que a sociedade passou a atribuir à escola se tornou diferente do que era.

A circunstância de o decisor político optar por colocar todos os cidadãos na escola, em vez de lá ter apenas uma pequena parcela (destinada a ser a elite dominante), mudou claramente a natureza da escola pública. Isso deveria, na opinião da ministra, ter tido consequências na relação entre a administração e os professores, alterando o mandato que é atribuído aos professores e modificando a natureza da aliança entre o Estado e os profissionais.

Não tendo feito estas alterações e continuando a permitir a influência dos saberes profissionais na organização da escola, o Estado teria permitido que os professores se tornassem uma espécie de “forças de bloqueio” em relação à escola para todos até ao 9º ano.

A certa altura do discurso a ministra recordou uma conversa com uma professora de matemática. Segundo as palavras de MLR tratava-se de uma professora “sénior”, com sólida formação e certamente uma excelente professora em termos científicos e didácticos. No entanto a ministra relatou que a dita professora a tinha interpelado dizendo «Eu tenho direito a ter os meus bons alunos, que querem aprender comigo. A senhora, mesmo como ministra, não tem o direito a por na minha escola os que não querem saber e não se esforçam por aprender». Daqui MLR concluiu da necessidade de romper o contrato entre a escola e os professores, uma vez que o mandato a atribuir hoje aos professores não se pode limitar ao ensino das matérias.

Olhando agora para trás e fazendo o balanço do que foram os ataques violentos que este ministério fez aos professores, podemos admitir que os mesmos se enquadravam numa estratégia de alteração do contrato entre o Estado e os profissionais, de forma a garantir à partida que o insucesso que se registou há 20 anos não se repetirá neste final de década.

A precarização da relação contratual entre os professores e a administração, o reforço da cadeia hieráquica de comando no interior das escolas e destas em relação às estruturas regionais do ME, de que o DL 75/2008 constitui o suporte legal, e a visão “resultadista” e sancionatória da ADD são as peças de um puzzle, que se traduz na expectativa de alargar a escolaridade obrigatória até ao 12º em menos de 3 anos.

MLR e o governo continuam a usar de ambiguidade ao fazerem passar a ideia de que escolarizar jovens até aos 18 anos é a mesma coisa que alargar a escolaridade até ao 12º ano. Esse é o engano em que induzem os portugueses e que se destina a obter alguns ganhos eleitorais. Essa é sobretudo uma medida que se destina a diminuir os números do desemprego, uma vez que num passe de mágica deixa de haver desempregados com menos de 18 anos.

Quanto ao erro da ministra e do governo, esse consiste em mais uma vez terem preferido o caminho do autoritarismo e do voluntarismo bacoco, impondo situações consumadas em vez de ouvir, debater e convencer os profissionais, a quem terão que recorrer para aplicar as medidas decididas.

No meio de tudo isto e recordando o que ouvi a ministra dizer na 5ª feira passada em Bragança, uma coisa me impressiona sobremaneira – a persistência no erro, a insistência no quero posso e mando, mesmo quando quem “manda” sabe que só pode exercer a sua autoridade se esta for reconhecida por quem é mandado.