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Este governo Pinto de Sousa constitui um caso que mereceria um estudo aprofundado.
Se admitirmos que existe um pensamento e uma linha política que determina a sua acção, só a poderíamos bapizar como estando para lá da 4ª Via, i.e., uma mistura verdadeiramente explosiva entre a defesa de valores neo-liberais potenciadores do mercado, regulados com mão férrea por uma estrutura burocrática, que em nada fica atrás das estruturas stalinistas do tempo dos planos quinquenais.
O recentíssimo despacho, assinado a 8 de Julho pelo inefável VL, sobre as ACND (Área de Projecto, Estudo Acompanhado e Formação Cívica) é um exemplo acabado de como a tentação reguladora centralista e burocrática se sobrepõe à retórica autonómica do discurso governamental.
Ainda por cima a maior parte das injunções contidas no despacho não introduzem alterações no quotidiano da generalidade das escolas, pelo que se trata de regulamentação desnecessária uma vez que pretende regular o que já está regulado. O problema é que tanto VL como a sua chefe desconfiam da regulação horizontal, apesar de serem confessos admiradores do mercado. Por isso acham necessário cunhar a regulação vertical e burocrática enquanto garante de que a nível local todos vestem o mesmo figurino.
Tomemos o exemplo da Formação Cívica. Embora a legislação nunca o tivesse imposto, na generalidade (talvez até mesmo na totalidade) das escolas é uma área atribuída à direcção de turma (pessoalmente discordo de tal facto, parecendo-me que deveria ser atribuída a professores com formação específica e elevados padrões de comportamento cívico). Ora o nosso estimadíssimo VL não só vem agora determinar que passa a ser obrigatório aquilo que já é uma prática generalizada, como ainda por cima esvazia o conceito de formação para a cidadania que devia presidir à planificação desta área. É que, ao determinar que: «a área disciplinar da Formação Cívica deve ser atribuída aos Directores de Turma e o seu tempo curricular utilizado para, através da participação dos alunos, regular os problemas de aprendizagem e da vida da turma», mais não se faz do que propor a extensão do trabalho do DT no âmbito das tarefas de regulação disciplinar da turma. Trata-se de um convite claro para que o DT faça com toda a turma o trabalho de orientação e correcção de comportamentos individuais que, como tal, deviam ser tratados em conversas individuais ou em pequeno grupo.
E que dizer das orientações para o Estudo Acompanhado? Para VL a área de Estudo Acompanhado deve passar a ser uma extensão das “disciplinas centrais” do currículo. Claro que não tem o descaramento de explicitar o conceito no seu despacho, mas ao determinar a atribuição desta área aos professores de Matemática e Português VL passa a ideia subliminar da centralidade destas matérias e destes professores no currículo do ensino básico. Não passa pela cabeça de VL que, no âmbito da autonomia entretanto outorgada e praticada, muitas escolas tenham encontrado soluções muito mais criativas e úteis para a ultrapassagem das dificuldades que os alunos apresentam nestas áreas disciplinares. Não lhe pode passar pela cabeça (até porque a sua prática de professor do ensino básico é o que é) que em muitas escolas o desenho curricular tenha determinado a atribuição do tempo de oferta de escola a actividades de enriquecimento relacionadas com o Português e a Matemática, como as Oficinas de Leitura e Escrita ou os Clubes de Matemática. Como também não lhe passa pela cabeça que um professor de Educação Física possa fazer leitura recreativa com os seus alunos, ou um professor de EVT ou de Música possa ajudar um aluno a melhor entender a resolução de um problema.
O que nos vale e consola é que antes de nos reformarmos ainda veremos entrar e sair muitos VL, muitos JP e muitas MLR pelas portas da 5 de Outubro. Dias mais claros virão, com a nossa ajuda e a nossa determinação!