Hoje o professor é considerado um profissional. O seu trabalho já não é, ou pelo menos não é apenas, cumprir tarefas predefinidas, é também, e antes de tudo, resolver os problemas. Pode inovar, pedir conselhos a quem quiser, mobilizar recursos locais, etc.: o que importa é que ele encontre um jeito para resolver os problemas na sua classe e entregue alunos bem sucedidos.

Mais uma vez, quero deixar claro que não estou denunciando essas lógicas. Gosto que os meus filhos tenham professores eficazes, ministrando um ensino de qualidade e sabendo resolver os problemas. O assunto é definir aquela eficácia, essa qualidade e determinar quais são os problemas a serem resolvidos. Qual o critério da qualidade? Ter boas notas? Passar de ano? Decorar conteúdos que foram memorizados sem terem sido compreendidos? Entender a vida, o seu relacionamento com os outros e consigo mesmo? É esse debate que me parece fundamental quando é colocada a questão da qualidade da escola, debate esse que remete ao aprimoramento do ensino e à modernização da formação dos jovens e da própria escola. Infelizmente, hoje em dia, o argumento da qualidade da escola serve, sobretudo, para justificar a generalização da concorrência já nas primeiras séries do ensino fundamental, às vezes no ensino infantil. Em adendo, ao falar da qualidade da escola, muito se esqueceu o problema da desigualdade social face à escola e dentro da escola. Neste caso, as lógicas da eficácia e da qualidade ocultam, sim, lógicas neoliberais.
Charlot, B., (2007), Educação e Globalização, Uma tentativa de colocar ordem no debate, Sísifo Set/Dez 2007 – FPCE-UL

Bernard Charlot é professor de Ciências da Educação na Universidade Paris VIII. Dedica-se ao estudo das relações com o saber, principalmente a relação dos alunos de classes populares com o saber escolar.

Em Portugal qualquer um acha que sabe tudo sobre a Escola e os professores. Diariamente, ao abrir um jornal ou uma revista, ao ouvir um qualquer fórum na rádio ou na televisão, ou ao assistir a qualquer debate sobre a educação, ficamos com a sensação de que toda a gente sabe tudo sobre educação menos os profissionais que trabalham no terreno e os investigadores que estudam a Escola e as complexas relações que aí se estabelecem entre a aprendizagem, a profissionalidade docente e o conhecimento.

Quando recorrentemente ouvimos um ataque cerrado à Escola e ao trabalho que ela desenvolve, a coberto de uma acusação generalista contra um fantasma chamado “eduquês”; quando vemos que se misturam as políticas que promovem aquilo a que o professor Adriano Moreira chama o “Estado exíguo” com o trabalho de investigadores e práticos no campo das Ciências da educação; quando os professores só conseguem fazer ouvir a sua voz em revistas e fóruns da especialidade, então só apetece mandar os “especialistas dos mídia” lerem alguma da excelente reflexão que se produz sobre a Educação, tanto no estrangeiro, como no nosso país, como é o caso do texto de que deixo um pequeno excerto no início deste post.